
Portugal já não é dos países da Europa com mais emigração. Números revelam saída de 70 mil nacionais em 2023
A emigração portuguesa já não se encontra entre as mais elevadas da Europa em números absolutos, sendo ultrapassada por países como a Roménia, Itália e Polónia. Em 2023, cerca de 70 mil portugueses emigraram, um número significativamente inferior ao registado há uma década, quando, em 2013, saíram do país 110 mil pessoas. No entanto, quando se analisa a proporção da população total emigrada, Portugal mantém-se no topo da lista europeia, com cerca de 20% da sua população a viver no estrangeiro.
Os dados foram divulgados no âmbito do novo Portal da Emigração Europeia, uma plataforma criada pelo Observatório da Emigração, que será oficialmente lançada esta quinta-feira, numa conferência no Iscte – Instituto Universitário de Lisboa. A iniciativa permitirá uma comparação mais abrangente e detalhada dos fluxos migratórios dentro do espaço europeu, cobrindo todas as nacionalidades e destinos dentro da Europa.
Até agora, as estatísticas migratórias estavam essencialmente focadas na imigração – ou seja, no número de pessoas que entram em determinado país. O novo portal reverte essa lógica e contabiliza as saídas, permitindo um retrato mais realista da mobilidade europeia. “Fomos fazer a contabilização na perspetiva de quem sai e não na perspetiva da imigração, porque isso já existe”, explica Cláudia Pereira, coordenadora do Observatório da Emigração e ex-secretária de Estado da Integração e das Migrações (2019-2022), em declarações ao jornal Público.
Desta forma, é agora possível analisar o fluxo de emigrantes de 31 países – os 27 da União Europeia, mais o Reino Unido, Suíça, Noruega e Islândia. Entre os que mais emigraram em 2023 destacam-se a Roménia (225 mil emigrantes), Itália (125 mil) e Polónia (110 mil). O portal também permite identificar os destinos mais procurados dentro da União Europeia, sendo a Alemanha e a Espanha os países que receberam maior número de emigrantes romenos, italianos e polacos.
Os dados do novo portal podem ser complementados com informações do Eurostat, que abrangem tanto a Europa como o resto do mundo. As estatísticas indicam que 10% dos emigrantes europeus vivem fora da Europa, enquanto 4% (cerca de 18 milhões de pessoas) residem noutros países europeus. “É nestes 18 milhões que nos estamos a focar. E podemos concluir que todos os países têm aumentado a sua emigração nos últimos dez anos”, sublinha Cláudia Pereira.
Portugal continua a destacar-se na emigração quando se analisa a percentagem da população total que reside no estrangeiro. Cerca de 20% da população portuguesa vive fora do país, o que mantém Portugal no topo da lista europeia neste indicador. No entanto, se a análise se restringir apenas à emigração para outros países europeus, Portugal apresenta um valor de 11%, ficando abaixo da Roménia (17%) e da Croácia (16%). “A maioria da nossa emigração está já na Europa, desde os anos 1960”, explica a investigadora, referindo que 9% da população portuguesa emigrada está fora do continente europeu. No total, estima-se que 2,2 milhões de portugueses vivam no estrangeiro.
A criação do Portal da Emigração Europeia responde a um problema persistente: a falta de dados fiáveis sobre os fluxos migratórios de saída na Europa. Segundo Cláudia Pereira, “hoje em dia, não há dados fiáveis sobre a emigração europeia, porque, em países democráticos, não há registos de saída da população, apenas de entrada”.
Para contornar essa lacuna, o Observatório da Emigração utiliza as chamadas estatísticas em espelho – ou seja, recolhe dados sobre a entrada e fixação de cidadãos portugueses noutros países, assumindo que esses registos refletem, indiretamente, as saídas de Portugal. Esta metodologia será agora aplicada a todas as nacionalidades abrangidas pelo novo portal. “Todos os outros países europeus vão passar a usar o nosso site para ter essa perspetiva abrangente”, afirma Cláudia Pereira.
Uma das dificuldades na recolha de dados reside na ausência de registo de entrada de cidadãos dentro do espaço Schengen, onde a livre circulação dispensa controlos fronteiriços. No entanto, há outras formas de obter informação, como os institutos nacionais de estatística, os censos e os inquéritos ao emprego. Além disso, muitos emigrantes europeus têm de preencher um certificado de residência quando pretendem trabalhar ou inscrever os filhos na escola no país de destino, o que também contribui para a recolha de dados. “Quando se é reformado, por exemplo, não é preciso. Mas, para trabalhar, é preciso preencher esse certificado”, esclarece a investigadora.
A nova abordagem permitirá ainda perceber o impacto da emigração nos países mais desenvolvidos. Segundo Cláudia Pereira, “os países de elevado desenvolvimento humano apresentam hoje taxas de emigração superiores às dos países de desenvolvimento baixo ou intermédio, de acordo com os últimos dados das Nações Unidas”.