Pietro Parolin: É este o ‘calcanhar de Aquiles’ do favorito à sucessão do Papa Francisco

O secretário de Estado do Vaticano lidera as apostas para o próximo conclave, mas a falta de experiência pastoral e a possível falta de apoio de Francisco lançam dúvidas sobre a sua candidatura.

A infância de Pietro Parolin, o grande favorito para suceder a Francisco, parece ter sido marcada por um destino anunciado. Em Schiavon, uma pequena localidade da região italiana do Véneto onde nasceu há 70 anos, ainda há quem recorde o pequeno Pietro a montar altares improvisados, celebrar “missas” e a distribuir bênçãos em latim. À pergunta clássica sobre o que gostaria de ser quando crescesse, respondia invariavelmente: “Papa”.

Hoje, Parolin, atual secretário de Estado do Vaticano e figura central dos 12 anos de pontificado de Francisco, parece mais próximo do que nunca de concretizar esse sonho infantil. Com o início do conclave a ser anunciado esta segunda-feira, o seu nome lidera de forma destacada todas as listas e casas de apostas britânicas, afastando progressivamente o outro grande favorito, o cardeal filipino Luis Antonio Tagle.

Parolin apresenta-se com várias vantagens evidentes. Num conclave onde muitos cardeais pouco se conhecem, o secretário de Estado beneficia de uma ampla rede de relações pessoais, construída ao longo dos anos no serviço diplomático da Santa Sé e nas inúmeras viagens realizadas. É conhecido por praticamente todos os 135 cardeais com direito de voto. Além disso, apresenta a idade ideal: 70 anos, um equilíbrio desejável num contexto em que se evitam papas demasiado idosos ou demasiado jovens, para não repetir pontificados extremamente breves ou excessivamente longos, como o de João Paulo II, que durou quase 27 anos.

A grande fragilidade de Parolin
Contudo, nem tudo joga a seu favor. O maior “calcanhar de Aquiles” de Parolin é a ausência de experiência pastoral direta: nunca exerceu como sacerdote numa paróquia, nunca esteve no terreno a cuidar de uma comunidade. Para alguns cardeais, essa falta de contacto pastoral é um fator de peso a considerar.

Acresce que não está claro que o próprio Francisco desejasse ver Parolin como seu sucessor. As dúvidas intensificaram-se há dois meses, quando, em fevereiro, o Papa argentino — já com a saúde bastante debilitada — decidiu prorrogar o mandato de Giovanni Battista Re como decano do Colégio Cardinalício. Re, de 91 anos, ocupava o cargo há cinco anos.

A decisão foi significativa porque o decano desempenha um papel crucial no conclave: preside à missa do funeral do papa falecido e à missa “Pro Eligendo Pontifice”, imediatamente antes do início da eleição na Capela Sistina. No conclave de 2005, Joseph Ratzinger era decano, celebrou essas missas e acabou por ser eleito papa na quinta votação.

Se Francisco não tivesse renovado o mandato de Re, seria altamente provável que Parolin fosse escolhido como novo decano pelos 12 cardeais-bispos. Tal posição teria oferecido a Parolin uma visibilidade imensa e impulsionado ainda mais a sua candidatura. Em vez disso, a decisão de Bergoglio foi interpretada nos bastidores como uma tentativa deliberada de evitar que Parolin ganhasse essa vantagem.

Além disso, na passada Semana Santa, quando Francisco já se encontrava em convalescença, Parolin também não recebeu qualquer papel relevante nas celebrações, outro sinal interpretado como indicativo de que o Papa argentino não lhe desejava facilitar o caminho.

Ainda assim, no último domingo, Parolin presidiu a uma missa na Praça de São Pedro, perante 200 mil fiéis, no âmbito dos “novendialis”, os nove dias consecutivos de celebrações para honrar a memória de Francisco. “O pastor que o Senhor ofereceu ao seu povo, o papa Francisco, terminou a sua vida terrena e deixou-nos”, afirmou Parolin na sua homilia. “A dor da sua partida, a tristeza que nos envolve, a inquietação que sentimos no coração, o sentimento de perda, tudo isto estamos a viver, como os apóstolos mergulhados no luto pela morte de Jesus”, acrescentou.

O caminho até à eleição
Apesar do favoritismo, a eleição de Parolin não está garantida. Para ser eleito, são necessários dois terços dos votos dos cardeais eleitores — pelo menos 89 dos 133 presentes, dado que dois dos 135 cardeais com direito de voto já justificaram ausência por motivos de saúde. Esta é uma fasquia exigente e, até ao momento, ninguém, nem sequer Parolin, parece contar com esses apoios de forma segura.

Desde 2007, após uma alteração introduzida por Bento XVI, esta exigência de dois terços mantém-se válida durante todo o conclave, ao contrário do que previa anteriormente João Paulo II, que permitia que, a partir da 34.ª votação, bastasse uma maioria simples.

Assim, se Parolin ou Tagle, os dois nomes mais falados, não conseguirem reunir rapidamente os 89 votos necessários, o conclave poderá evoluir para a procura de um candidato de consenso, alguém capaz de unir as diversas correntes. Entre os possíveis nomes que poderiam então emergir figuram também dois cardeais espanhóis: Cristóbal López Romero, de 72 anos, e Ángel Fernández Artime, de 64.

Um futuro incerto
Com o início das congregações gerais esta segunda-feira às 9h00, as reuniões pré-conclave ganham agora uma importância decisiva. Se na semana passada os encontros serviram essencialmente para tratar de questões administrativas e da gestão da sede vacante, a partir de hoje os cardeais começarão a avaliar mais atentamente os perfis dos potenciais sucessores.

Pietro Parolin entra nesta fase com vantagem clara, mas sem certezas absolutas. Como tantos conclaves anteriores mostraram, tudo pode mudar rapidamente dentro da Capela Sistina.