Operação Marquês: Sócrates considera decisão do tribunal em enviá-lo para julgamento “um logro e um abuso”

José Sócrates reagiu, esta sexta-feira, à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, considerando que o “despacho do senhor juiz é um logro e é um abuso”.

Em comunicado, o antigo primeiro-ministro salientou que o “o processo Marquês não irá para julgamento porque não existe nem pronúncia nem acusação”, reiterando que “o despacho do senhor juiz é um logro e é um abuso. Mais um abuso”.

O antigo secretário-geral do Partido Socialista recordou o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de maio último, no qual se podia ler que “pese embora ter revogado a decisão recorrida (…) o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/1/2024 não configura uma decisão instrutória de pronúncia”, apontou, salientando que dará uma conferência de imprensa sobre os “últimos desenvolvimentos do processo Marquês”.

Recorde-se que o Tribunal da Relação de Lisboa determinou esta sexta-feira que o processo da Operação Marquês, que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates e mais 17 arguidos, siga imediatamente para julgamento na primeira instância. O primeiro-ministro irá assim, segundo o despacho, responder por 22 crimes. A decisão, assinada pelo juiz Francisco Henriques, marca um ponto de viragem num dos casos judiciais mais mediáticos em Portugal, ao afastar a possibilidade de novos recursos atrasarem o início do julgamento.

O despacho de Francisco Henriques ordena que “os autos baixem imediatamente à 1ª instância”, sendo distribuídos por um trio de juízes disponível para realizar o julgamento. Segundo o documento, citado pelo Público, a remessa será acompanhada por uma comunicação ao Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa para tratar de partes do processo ainda ali pendentes.

Apesar desta decisão, questões logísticas e processuais poderão atrasar o início efetivo dos trabalhos. A maior sala de audiências do Campus da Justiça, em Lisboa, está atualmente ocupada pelo julgamento do caso BES, o que levanta dificuldades para acomodar os 18 arguidos, os respetivos advogados e outros intervenientes no caso.

Embora o primo de José Sócrates, José Paulo Pinto de Sousa, e outros arguidos, como Armando Vara e Carlos Santos Silva, tenham interposto recursos junto do Tribunal Constitucional, a Relação esclareceu que estes não possuem efeito suspensivo. A mesma lógica aplica-se ao recurso de Pinto de Sousa no próprio Tribunal da Relação.

Os arguidos têm utilizado reiteradamente manobras dilatórias para contestar decisões e prolongar o processo. Contudo, nos últimos meses, os tribunais adotaram medidas mais rigorosas para travar estas estratégias. Francisco Henriques e outros magistrados decidiram, por exemplo, antecipar a exigência de pagamento de custas judiciais para penalizar o uso abusivo de recursos. Até o Supremo Tribunal de Justiça seguiu este caminho, aplicando a mesma disposição legal para limitar os expedientes litigantes de Sócrates.

Crimes imputados a José Sócrates

José Sócrates, o principal arguido, será julgado por 22 crimes, incluindo corrupção, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal. O Ministério Público acusa-o de ter recebido cerca de 34 milhões de euros entre 2006 e 2015, num esquema que alegadamente favoreceu interesses de Ricardo Salgado, ex-presidente do Grupo Espírito Santo (GES), e de outros parceiros empresariais.

Entre as acusações estão a alegada troca de favores em projetos como o empreendimento de Vale do Lobo, a concessão de financiamentos pela Caixa Geral de Depósitos e negócios relacionados com a Portugal Telecom.

De acordo com o mesmo jornal, a logística necessária para acomodar o julgamento será um desafio. Casos de grandes dimensões como este, com múltiplos arguidos e equipas jurídicas, exigem instalações adequadas, que neste momento são limitadas. Recentemente, outro processo que envolvia tráfico de droga foi adiado por falta de espaço no Campus da Justiça.

Ainda assim, se não houver mais atrasos, espera-se que o julgamento seja marcado dentro de dois a três meses.