
Ministra da Saúde “lamenta” casos de pagamentos milionários a médicos mas reforça confiança na administração do Santa Maria
O Governo português reiterou esta quinta-feira a sua confiança na atual administração do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, apesar das suspeitas graves de práticas irregulares no pagamento de atos médicos naquele que é o maior hospital público do país. Em causa estão valores pagos a um dermatologista que, segundo uma investigação da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal), terá recebido cerca de 400 mil euros em apenas 10 sábados de trabalho — num dos quais auferiu 51 mil euros num só dia.
A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, reconheceu a gravidade da situação, mas defendeu publicamente a administração da unidade hospitalar. “Lamentamos muito a situação que se está a passar, confiamos muito nas autoridades que a estão a investigar, confiamos muito no conselho de administração do Hospital de Santa Maria para poder tomar as medidas necessárias”, afirmou a governante aos jornalistas.
Reforçando a ideia de que o caso não representa a totalidade do setor, Ana Paula Martins acrescentou: “Deixem-me dizer-vos aquilo que eu já disse outro dia, a árvore não faz a floresta”. A ministra sublinhou ainda o papel positivo que o atual sistema de gestão de listas de espera, o SIGIC (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia), teve ao longo dos últimos anos: “Ao longo de 20 anos, o SIGIC resolveu muitos problemas a muitos doentes e a maioria dos profissionais agiu com zelo, ética e sentido de responsabilidade.”
Na mesma ocasião, Ana Paula Martins anunciou que o Governo irá substituir o SIGIC por um novo modelo, o SINAC – Sistema Nacional de Acesso a Cuidados. Este novo sistema está a ser desenvolvido há um ano e visa combater práticas indevidas, garantir maior transparência e melhorar a eficiência na gestão das listas de espera.
Segundo a ministra, o SINAC terá três características fundamentais. A primeira é a centralização da informação e a transparência: “O cidadão sabe exatamente em que posição está na lista de espera. São listas nacionais, sabe qual é a sua prioridade e pode consultar o processo”, explicou.
A segunda dimensão incide sobre a melhoria na codificação dos atos médicos. Atualmente, uma mesma pessoa pode registar, codificar e executar o procedimento, algo que Ana Paula Martins classificou como “uma prática inadequada”. Com o novo sistema, estas funções serão separadas e acompanhadas por um manual de boas práticas.
A terceira medida procura eliminar os chamados “incentivos perversos”. Quando um utente atingir o tempo máximo de resposta garantido, será automaticamente contactado para ser encaminhado para tratamento noutra unidade — seja pública, privada ou do setor social. “Isto visa impedir que profissionais criem listas para posteriormente as resolverem em seu benefício. Estamos a desenhar o sistema para o cidadão”, afirmou.
Relativamente à auditoria em curso no Hospital de Santa Maria, a ministra salientou que foi o próprio conselho de administração a solicitar a investigação. “As auditorias, a de Santa Maria especificamente, como sabem, foi pedida pelo atual conselho de administração”, referiu.
A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) tem já previstas auditorias nacionais para o ano de 2025, abrangendo não apenas o SIGIC mas diversas áreas da gestão hospitalar. “Essas auditorias são nacionais e são a várias áreas, não são apenas ao SIGIC, são também a outras áreas do funcionamento e da gestão dos hospitais”, esclareceu Ana Paula Martins.
Apesar de reconhecer que o SIGIC apresentava “imensas lacunas”, algumas das quais “há muito sinalizadas por profissionais de saúde”, a ministra recusou a ideia de que o novo sistema tenha um caráter punitivo. “Não montámos o sistema para ser uma polícia dos hospitais, mas ele vai minimizar muito este tipo de situações”, garantiu.