
Milagre económico europeu está por um fio. Este país poderá ficar sem dinheiro da noite para o dia
A Irlanda tem sido apontada como um dos maiores milagres económicos da Europa, com um crescimento do PIB que supera o de países como a Noruega ou a Suíça. No entanto, essa bonança pode estar por um fio. A economia irlandesa tem beneficiado de forma extraordinária dos lucros registados por multinacionais tecnológicas e farmacêuticas, mas essa dependência extrema está agora sob ameaça, sobretudo perante a possibilidade de uma mudança de política fiscal por parte dos Estados Unidos, impulsionada por Donald Trump.
Só no último ano, o Produto Interno Bruto (PIB) irlandês cresceu 9,7%, tornando o país responsável por mais de metade do crescimento económico da zona euro, apesar de representar apenas 1% da população da União Europeia. No entanto, os economistas alertam que esta expansão tem pouco a ver com a atividade económica real dos irlandeses, revela o ‘elEconomista’.
Gigantes como a Apple, Microsoft ou Pfizer transferem para a Irlanda direitos de propriedade intelectual e lucros de operações globais, aproveitando-se da taxa de imposto sobre lucros empresariais de apenas 12,5%. O resultado? Um PIB per capita inflacionado e uma arrecadação anual de cerca de 20 mil milhões de euros em impostos, que tem sustentado serviços públicos como saúde e educação — mas com pouca margem para poupança.
Segundo o semanário The Economist, a Irlanda gastou praticamente todo o valor arrecadado nos últimos anos, poupando apenas cerca de 10% dos 160 mil milhões de euros obtidos em receitas corporativas na última década. Ao contrário da Noruega, que criou um fundo soberano com as receitas do petróleo, Dublin tem-se mostrado lenta na preparação para tempos de menor abundância.
Agora, a ameaça de Donald Trump lançar novas tarifas e travar o planeamento fiscal agressivo das multinacionais reacende os receios. Em março, durante a habitual visita do primeiro-ministro irlandês à Casa Branca por ocasião do Dia de São Patrício, o ex-presidente norte-americano criticou duramente o tratamento fiscal dado às empresas nos EUA, sugerindo que a Irlanda estaria a enriquecer à custa dos americanos. Trump já ameaçou impor tarifas “recíprocas” e voltar a mexer nas regras fiscais internacionais caso regresse ao poder.
A dependência da Irlanda de um punhado de grandes empresas é tal que, em 2023, apenas três companhias foram responsáveis por 38% de toda a receita de imposto corporativo do país. Além disso, 11% da força de trabalho depende diretamente de multinacionais estrangeiras, que representam um terço das receitas de imposto sobre o rendimento.
No entanto, os efeitos colaterais deste sucesso são visíveis. Em Dublin, os preços da habitação dispararam com a chegada de milhares de trabalhadores das tecnológicas, agravando a crise imobiliária. O Conselho Consultivo Fiscal Irlandês já alertou para o risco de a Irlanda sofrer da chamada “doença holandesa”, um fenómeno em que a abundância repentina de receitas externas distorce a economia nacional — como aconteceu com a Holanda nos anos 70 devido ao gás natural.