Mais Habitação. Propostas do Governo e da oposição em debate no Parlamento esta sexta-feira: conheça os temas mais polémicos

Aprovadas em Conselho de Ministros no dia 30 de março, as propostas de lei do Governo para combater a crise na habitação – o programa Mais Habitação – que incluem medidas como o arrendamento forçado de casas devolutas, a suspensão de novas licenças de alojamento local ou o fim dos vistos gold, vão ser debatidas na generalidade no plenário desta sexta-feira. Serão também discutidos dez projetos de lei, um projeto de deliberação e dois projetos de resolução apresentados pela oposição.

Em vigor já estão os diplomas referentes ao apoio à renda e à bonificação dos juros no crédito à habitação, que o Governo pôde adotar sem discussão parlamentar prévia.

Apresentado em 16 de fevereiro, o programa Mais Habitação assenta em cinco eixos:

  • aumentar a oferta de imóveis para fins de habitação
  • simplificar os processos de licenciamento
  • aumentar o número de casas no mercado de arrendamento
  • combater a especulação imobiliária
  • apoiar as famílias

Enquanto o novo pacote esteve em consulta pública, o Ministério da Habitação recebeu “mais de 2.700 contributos” com sugestões e pedidos de alteração.

Propostas de quase toda a oposição, com exceção de IL e PAN

Na Assembleia da República, serão discutidas com os diplomas do Governo propostas de quase toda a oposição, com exceção de IL e PAN.

O BE lidera em número, com cinco projetos de lei, enquanto Chega e PCP assinam dois projetos de lei cada e o deputado único do Livre um.

O PSD, maior partido da oposição, apresenta um projeto de deliberação e um projeto de resolução (sem força de lei), mas já antes tinha levado ao parlamento um conjunto de dez diplomas (depois condensados em cinco), que foram viabilizados pelo PS, seguindo para discussão na especialidade.

A Saber:

PSD leva a debate uma proposta de estudo para avaliar os “efeitos das alterações ao regime do arrendamento urbano nos últimos dez anos” e uma recomendação ao Governo para que adote “um regime especial” de vistos ‘gold’ para as regiões autónomas.

Nos pareceres às novas medidas, o Governo Regional da Madeira pede também a não aplicação da contribuição extraordinária sobre o alojamento local, enquanto o Governo Regional dos Açores anuncia ser “desfavorável” ao pagamento pelo Estado, nos casos de despejo, das rendas vencidas após o fim do prazo de oposição.

Voltando aos projetos de lei da oposição, o Chega propõe uma comissão de mediação para a renegociação de contratos, com entidades “representativas dos diferentes interesses em presença”, e o reforço dos incentivos à estabilidade nos contratos de arrendamento para habitação própria e permanente, bem como a redução da tributação sobre os rendimentos prediais.

Os projetos de lei do BE versam sobre a eliminação dos benefícios fiscais para fundos de investimento imobiliário e a proibição da venda de casas a não residentes. Os bloquistas apresentam ainda um conjunto de normas para controlo de rendas e defendem que o novo edificado construído em Portugal, onde apenas 2% da habitação é pública, tenha uma quota mínima de 25% para arrendamento ou construção a custos controlados.

PCP apresenta uma série de medidas, entre as quais um regime especial de proteção da habitação própria e a mobilização de património público para fins habitacionais. Os comunistas propõem ainda o fim dos regimes fiscais de favorecimento, nomeadamente para residentes não habituais, e um regime extraordinário de proibição de penhora e execução de hipoteca de habitação própria permanente.

No projeto de resolução que também apresenta, o PCP pede o reforço de meios do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU).

No mesmo sentido vai o projeto de lei do deputado único do Livre, Rui Tavares, propondo que o IHRU seja dotado com “capacidade técnica e financeira capaz de assegurar 100.000 novos fogos para habitação em dez anos”.

Pareceres de outras entidades

Outras entidades emitiram pareceres sobre o novo pacote de medidas, nomeadamente a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e a Associação Nacional de Freguesias (Anafre).

A ANMP condicionou a emissão de um parecer favorável à resolução de “questões fundamentais” relacionadas com as medidas sobre arrendamento forçado, alojamento local, incentivos fiscais à reabilitação urbana e poderes tributários dos municípios.

A ANMP identifica o arrendamento forçado de habitações devolutas como uma das medidas que “mais preocupa” o poder local, assinalando que os municípios que não cumpram essa disposição serão penalizados com o fim das taxas agravadas de IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) sobre os prédios devolutos.

A associação propõe também limites à “suspensão automática e generalizada de novas licenças” de alojamento local e considera que “não é admissível” que o Estado central conceda unilateralmente isenções automáticas de impostos que geram receitas municipais.

Recusando dar parecer, a Anafre lamenta que não se tenha considerado o “potencial de contribuição assinalável” das freguesias para as políticas públicas de habitação.

“As freguesias apenas são mencionadas em dois normativos”, lamenta, acrescentando que “não foram incluídas” entre os beneficiários do apoio à habitação para arrendamento acessível, nem nas parcerias com as cooperativas.

As principais medidas do programa da habitação

Limitações à subida da renda dos novos contratos

O valor da renda inicial dos novos contratos de casas que estiveram no mercado de arrendamento nos últimos cinco anos não pode ultrapassar os 2% face à anterior. A este valor podem ser somados os coeficientes de atualização automática dos três anos anteriores (caso não tenham sido aplicados), sendo considerados 5,43% em relação a 2023.

As casas cuja renda seja inferior à dos limites máximos por tipologia previstos no programa de arrendamento acessível (PAA) não ficam abrangidas por aquele limite de atualização.

Rendas antigas atualizadas pela inflação

Os contratos de arrendamento antigos (anteriores a 1990) cujos inquilinos com rendimento anual bruto corrigido inferior a cinco salários mínimos nacionais ou tenham idade igual ou superior a 65 anos ou incapacidade superior a 60% não transitam para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).

As rendas em causa vão passar a ser atualizadas de acordo com a inflação e a beneficiar de isenção de IRS e de IMI. Está ainda previsto o pagamento de uma compensação aos senhorios.

Suspensão por dois anos para revestimento da venda da casa

A proposta de lei prevê a suspensão por dois anos do prazo para revestimento do valor da venda casa de habitação, evitando a tributação das mais-valias, com a medida a ter efeitos em 01 de janeiro de 2020. Na prática, isto interrompe durante dois anos o prazo de 36 meses que as pessoas têm para investir numa nova casa o valor da venda da habitação própria e permanente — e durante o qual se beneficia de isenção de tributação.

A suspensão da contagem deste prazo de 36 meses abrange as vendas ocorridas antes de 2020.

Balcão do Arrendatário e do Senhorio

A tramitação do procedimento especial de despejo e da injunção em matéria de arrendamento passa a ser assegurada através do novo Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS).

Estado paga rendas em atraso após três meses de incumprimento

O Estado vai substituir-se ao inquilino e pagar rendas com três meses de incumprimento, para reforçar o mercado de arrendamento. Desta forma, caberá ao Estado avaliar a situação do inquilino e poderá avançar para a cobrança dos valores em falta usando os meios atualmente existentes para a cobrança de outras dívidas. Sendo o incumprimento devido a carência de meios, o caso é articulado com a Segurança Social e retirado do BNA.

Mais-valias de casas vendidas ao Estado e municípios isentas de IRS

As mais-valias resultantes de venda de imóveis ao Estado ou aos municípios ficam isentas de IRS e IRC, ficando apenas de fora desta medida as auferidas por residentes na lista de territórios e países que Portugal classifica de paraísos fiscais. Igualmente de fora desta isenção ficam as mais-valias que resultem de vendas através do exercício de direito de preferência.

Atualmente 50% da mais-valia gerada tem de ser englobada ao restante rendimento sendo sujeita às taxas progressivas do IRS.

Incentivo à mudança das casas de Alojamento Local (AL) para arrendamento

As casas atualmente afetas ao Alojamento Local (AL) que transitem para o mercado de arrendamento vão ter isenção de IRS e IRC sobre as rendas até 31 de dezembro de 2029.

Para tal, o contrato de arrendamento terá de ser efetuado até 31 de dezembro de 2024, sendo que apenas os imóveis com registo de AL até 31 de dezembro de 2022 são elegíveis.

Suspensão de novas licenças de AL

As emissões de novas licenças de alojamento local vão ser suspensas, com exceção das zonas para alojamento rural, cabendo aos municípios definir o “adequado equilíbrio” de oferta de habitação e alojamento estudantil que permitam o fim desta suspensão.

A proposta do Governo prevê, contudo, que a suspensão destes registos se mantém nos municípios que tenham declarado situação de carência habitacional.

Caducidade e renovação dos registos de AL

Os registos de alojamento local passam a ter a duração de cinco anos, renováveis por igual período, com a proposta do Governo a determinar que os registos emitidos à data de entrada em vigor da lei que enquadra o Mais Habitação, “são reapreciados durante o ano de 2030.

Esta caducidade não se aplica nas situações em que os estabelecimentos de AL “constituam garantia real de contratos de mútuo celebrados até 16 de fevereiro de 2023 e que não tenham sido liquidados em 31 de dezembro de 2029 e “cuja primeira reapreciação só tem lugar após a amortização integral, inicialmente contratada”.

Além disso, no prazo de dois meses após a entrada em vigor da lei, os titulares de registo de AL são obrigados a efetuar provada da atividade sob pena de o registo caducar.

Condóminos podem opor-se ao AL

Os condóminos podem opor-se ao AL em frações autónomas de edifícios ou em partes dos prédios urbanos, se for essa a deliberação de mais de metade da permilagem do edifício. Tal não oposição não pode verificar-se caso o título construtivo preveja essa utilização (AL).

Contribuição extraordinária para o AL

O alojamento local vai passar a pagar uma contribuição extraordinária cuja base tributável é constituída pela aplicação de um coeficiente económico (que tem em conta a área do imóvel e o rendimento) e de pressão urbanística. A taxa aplicável a esta base tributável é de 20%.

O valor patrimonial tributário (VPT) para efeitos de IMI das casas no alojamento local é sempre igual a 1, deixando de beneficiar da redução do coeficiente de vetustez que acompanha a idade do imóvel.

Arrendamento forçado de casas devolutas

É uma das medidas que mais críticas tem gerado e que consiste na possibilidade de arrendamento forçado de casas que se encontrem devolutas há mais de dois anos e se localizem fora do interior do país.

As casas de férias, as que se encontram vagas por o respetivo dono se encontrar num lar ou a prestar cuidados permanentes como cuidador informal e as dos emigrantes, bem como as das pessoas deslocadas por razões profissionais, de saúde ou formativas, não são consideradas devolutas para este efeito.

A proposta prevê que após dois anos, o município notifique o proprietário para fazer obras ou dar uso ao imóvel, tendo este um prazo de 90 dias para responder, findo o qual, mantendo-se a casa vazia, as autarquias podem proceder ao arrendamento forçado.

A lei que define o que é uma casa devoluta já prevê que as empresas de água, luz, gás e telecomunicações enviem às autarquias uma lista com informação sobre consumos, e a proposta do Governo acrescenta que esta lista passa a incluir obrigatoriamente a identificação matricial de cada prédio.

Fim das taxas agravadas de IMI para autarquias que não arrendem casas devolutas

As autarquias que não utilizem a faculdade que a lei lhes confere no que diz respeito ao arrendamento forçado das casas devolutas deixam de poder aplicar taxas agravadas de IMI a imóveis devolutos.

Benefícios fiscais para obras de casas do arrendamento acessível

O Governo quer alargar o número de casas disponíveis no programa do arrendamento acessível (PAA) e para tal está prevista uma taxa de IVA de 6% nas obras de construção ou reabilitação de casas que sejam maioritariamente afetas a este programa (pelo menos 70%), bem como isenção de IMI por três anos (prorrogável por mais cinco) e isenção de IMT na aquisição para reabilitação.

Inquilinos podem comunicar contrato de arrendamento ao fisco

Os arrendatários vão passar a poder comunicar ao fisco os contratos de arrendamento, subarrendamento, promessas e respetivas alterações ou cessação, caso o senhorio não o faça.

Isenção de mais-valias na venda de imóveis para pagar empréstimo

O programa prevê isenção de mais-valias na venda de imóveis da família desde que o valor se destine a pagar o empréstimo da casa de habitação própria e permanente do proprietário ou dos seus descendentes.

Esta isenção abrange imóveis cuja venda ocorra entre 01 de janeiro de 2023 e 31 de dezembro de 2024, com a proposta a determinar que a amortização tem de ser concretizada num prazo de três meses contados da data de realização.

Redução de 28% para 25% da taxa especial de IRS sobre as rendas

Os rendimentos de rendas (quando o contribuinte não opte pelo seu englobamento) passam a pagar uma taxa de IRS de 25%, em vez dos atuais 28%. Além disso, a redução da taxa de imposto que já existe para os contratos de maior duração é reforçada, sendo que no prazo mais longo (superior a 20 anos) baixa dos atuais 10% para 5%, acabando, porém, para os de duração entre dois e cinco anos.

Fim dos vistos ‘gold’

Vão deixar de ser concedidos vistos ‘gold’ pela aquisição de imóveis, com a proposta do Governo a fazer alguns afinamentos à renovação (a cada dois anos) dos já atribuídos e a determinar que são “admitidos os novos pedidos de autorização de residência relativos a investimentos ou apoios à produção artística, recuperação ou manutenção do património cultural nacional sobre os quais tenha sido emitida, previamente à entrada em vigor da presente lei, declaração pelo GEPAC”.

Conversão de imóveis de comércio e serviços em habitação

Prevê-se a possibilidade de alterar de forma automática o uso de imóveis de comércio ou serviços em imóveis para habitação, dispensando-se a revisão de planos de ordenamento do território ou da licença de habitação, desde que a custos controlados.

Solos ou edifícios disponibilizados a cooperativas de habitação

O Governo prevê ainda a disponibilização a cooperativas de habitação de solos ou de edifícios públicos para construção, ou reconversão em casas para arrendamento acessível.

Simplificação dos licenciamentos

Os projetos de arquitetura vão passar a ser licenciados apenas com base no termo de responsabilidade dos projetistas e as entidades públicas serão penalizadas no caso de atrasos na emissão de pareceres.

250 M€ para habitação a custos controlados

O programa prevê a aprovação de uma linha de crédito, com garantia mútua e bonificação da taxa de juro, para projetos de habitação acessível, nomeadamente construção ou reabilitação e para aquisição do imóvel, tendo este de ser colocado no mercado de arrendamento.

As casas promovidas com recurso a este apoio ficam afetas ao arrendamento acessível durante pelo menos 25 anos, podendo ser fixado prazo maior no contrato de arrendamento, findo o qual os municípios e o IHRU têm direito de preferência na aquisição das mesmas.

As entidades que podem concorrer a esta medida são as cooperativas, sociedades comerciais de construção civil, municípios e misericórdias ou outras instituições de solidariedade social.

Linha de 150 M€ para municípios realizarem obras coercivas

Prevê-se a criação de uma linha de financiamento de 150 milhões de euros, através do Banco Português de Fomento, para os municípios poderem realizar obras coercivas, reforçando, assim, o cumprimento das prerrogativas das autarquias no âmbito do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

 

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