“Liberalização do mercado postal é uma mera utopia, que não passou do papel”, diz CEO da Premium Green Mail

Os impactos da pandemia, a exigência do setor postal em Portugal, a concorrência, a sustentabilidade e as novas oportunidades foram o mote de uma conversa da Executive Digest com Ana Serrabulho, CEO da Premium Green Mail.

 

A pandemia de Covid-19 veio alterar o paradigma do setor dos serviços de entregas. Quais as principais diferenças no mercado?

O mercado postal tem, de per si, uma dependência extrema do fator “eficiência”, por aquelas que são as características intrínsecas do mercado.

Por um lado, a inevitável volatilidade de volumes, que impacta de forma direta na volatilidade da rúbrica de proveitos.  Por outro, a quantidade de recursos afetos, nomeadamente humanos, que não obstante as volatilidades da procura, tem que estar permanentemente “a postos”, com os inevitáveis custos “fixos” daí decorrentes, para responder atempadamente  e com qualidade.

Como gerir a dicotomia da volatilidade da procura, em quantidade e geografia, e o seu impacto nos proveitos, com as exigências operativas, no âmbito da prestação do serviço, da sua capacidade de resposta, e a otimização dos custos “fixos” subjacentes… eis a questão.

É este o dia a dia de gestão deste mercado, em que a única certeza é a de que todos os dias são diferentes e que a capacidade de “jogar na antecipação”, com informação, com agilidade, com flexibilidade, e em permanente reinvenção é determinante.

Um dia a dia de gestão cuja envolvente foi agravada na sua (in)certeza com o contexto de pandemia que vivemos e em que a capacidade de resposta das organizações do setor, e da PGM em particular, foi levada ao extremo, com pensamento e atuação ainda mais flexíveis e preditivos, com análise particular e acrescidamente cuidada dos custos.

A pandemia veio agudizar a necessidade de atuar de forma estratégica e com uma maior flexibilidade de processos. No contexto interno, os planos de contingência. Os procedimentos implementados, por exemplo, para garantir a saúde e integridade das pessoas que fazem a PGM e são a PGM, e que constitui mandamento obrigatório. Na vertente externa, olhando com grande atenção às novas necessidades do mercado, ao seu comportamento, e agilizando processos e a nossa capacidade de resposta.

Creio que podemos, seguramente, afirmar que o período pandémico reforça duas lições importantes: a necessidade realmente aguça o engenho e o estado de alerta desperta a necessidade de inovar, de fazer mais, melhor, conduzindo-nos à descoberta  de soluções, de capacidades, de elasticidades, de realidades que julgaríamos impossíveis, que superam os nossos limites, que marcam pela diferença,  e que nos acompanharão ao longo da vida.

 

Quais as exigências dos consumidores e das empresas na era pós-covid?

Em primeiro lugar, gostaria de sublinhar um fenómeno que, possivelmente, passou algo despercebido por muitos analistas: o período pandémico vivido por tantas empresas e com tantos impactos, teve características únicas que levaram, curiosamente ou não, a uma maior solidariedade e maior compreensão, não só internamente, no âmbito da própria cultura organizacional, bem como por parte dos vários agentes no mercado e dos clientes.

Cada um de nós, enquanto indivíduos, enquanto organização, enquanto parte integrante de uma sociedade, de um Mundo, que enfrentou um momento trágico na sua história, arregaçou mangas com “unhas e dentes”, envergou um papel de Missão que não se centrou unicamente em si, antes pelo contrário, em todo um coletivo, com sentido de pertença, de partilha, de solidariedade.

Por outro lado, este período criou hábitos e necessidades que passaram a integrar a própria natureza do negócio que se pretende mais rápido, confortável, interativo, personalizado e que alargou, transversalmente, a varias categorias de produtos/serviços . Não se trata apenas de agilidade, mas sobretudo o conforto que as soluções de entrega trazem para um cliente que hoje dá uma grande importância a um tratamento de qualidade e personalizado.

Naturalmente que as empresas, para se encontrarem dotadas de capacidade de resposta, com um serviço, ágil, flexível, atempado, personalizado, de qualidade, têm de apostar, em primeira instância, em toda a equipa de trabalho que consubstancia o serviço.

Têm paralelamente de viver em permanente “estado de alerta”, com radares de informação, que lhes permitam “jogar na antecipação”, e fazer face, a todo e qualquer instante, a todo e qualquer desafio, interno ou externo. Sim, porque, apesar de já não nos encontrarmos, felizmente, a viver um contexto de pandemia, a verdade é que muitas são as adversidades com as quais temos sido confrontados, exógenas ao “mundo” individual que cada um de nós gere diariamente, como seja, o contexto inflacionista, transversal a todos os setores, os aumentos as taxas de juro, a diminuição do poder de compra dos consumidores, (possíveis) impactos ao nível da retração dos consumos, etc.

Adversidades cujo potencial de agravamento é previsível e que se repercutem e farão repercutir de forma agravada no setor, sendo mais uma vez determinante o efeito preditivo e a agilidade de atuação.

 

Como caracteriza o mercado nacional no que diz respeito à concorrência neste setor? É um mercado justo ou há alguma posição dominante?

Em teoria, existe um mercado postal liberalizado há mais de 10 anos.

Do ponto de vista prático, a dinâmica do mercado, a sua evolução, as suas métricas, a sua realidade suscita, objetivamente, questões relativamente à realidade da liberalização.

Apesar de 2022 ter fechado com 70 operadores habilitados para prestação de serviços fora do âmbito do serviço universal (mais 20 face a 2011 no contexto de pré-liberalização) e 15 dentro do âmbito do serviço universal (mais 3 face a 2011), 97,3% do tráfego total está concentrado num total de 7 operadores, sendo que nestes 97,3%, 85,1 pp estao concentrados num único operador, o Grupo CTT.

No que respeita a encomendas, 93 % esta concentrado em 6 operadores, um deles, Grupo CTT, com 47,6% com posição reforçada inclusive face à posição tida em 2011, em contexto de pré-liberalização (34,8%).

No que respeita aos serviços integrados no âmbito do serviço universal, 97% está concentrado em 2 operadores, grosso modo 90,4% no Grupo CTT Concessionária de serviço Universal e 6,2% PGM.

No que respeita ao “mercado justo”…

Um mercado justo é um mercado assente em princípios basilares de level playing field (um mercado com regras, permitindo a igualdade de oportunidades para todos os operadores).

A manutenção, aos dias de hoje, de certos serviços reservados à concessionária.

O tratamento fiscal diferenciado, no âmbito dos serviços postais integrados no âmbito do serviço universal (segmento em que a PGM atua) em sede de IVA, isentando a Concessionária e sujeitando os demais operadores a 23%.

A diminuta expressão de procedimentos de contratação pública por parte de organismos públicos, inviabilizando o acesso de operadores concorrentes, com os impactos daí decorrentes para o mercado.

Constituem exemplos, de uma realidade, da realidade deste mercado, que não assentam, de todo, em nosso entender, em princípios de justiça, de equidade constituindo, natural e inevitavelmente, barreiras adicionais à entrada e desenvolvimento de novos operadores.

Se tal não bastasse, mais uma vez, em particular no segmento no qual a PGM atua – serviços integrados no âmbito do serviço universal – têm sido adotadas práticas por parte da Concessionária de serviço universal CTT que, no entender da PGM, suscitam sérias dúvidas no que à sua legitimidade respeita.

Quer pela inobservância da Lei n.º 17/2012, de 26 de abril, que estabelece o regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais, em plena concorrência, e em particular do quadro Regulamentar a que o Grupo CTT, enquanto Concessionária de Serviço Universal, se encontra vinculado, quer pela adoção de possíveis práticas de abuso de posição dominante, nomeadamente ao nível de possíveis preços predatórios e/ou agregação indevida de serviços, relativamente aos quais a PGM aguarda serenamente uma posição da Autoridade da Concorrência (AdC) requerida por aquela.

Não obstante possíveis necessidades de reformulação de legislação, com vista à sua adaptação à realidade, a verdade é que existe todo um conjunto de regras, transpostas num quadro legal em vigor, que tem que ser observado de forma obrigatória por todos os intervenientes, sem exceção, de acordo com o papel de mercado que lhes é conferido.

Face ao exposto, há ainda um caminho a percorrer no que respeita à evolução da concorrência no setor, nos seus vários segmentos, bem como no conceito de mercado “justo”.

Em termos de dinâmica concorrencial, a intenção do legislador não foi levada à prática por diversas razões. A primeira é que a legislação existente não é adequada e não está atualizada às necessidades, comprometendo a intenção de liberalizar. O que temos é apenas uma intenção que nunca foi vertida na letra da lei e que na prática leva a consequências claras. Em segundo lugar, a observância da legislação é, no mínimo, rudimentar e carece de uma verdadeira fiscalização. Por último, as consequências da não observância da lei não tem consequências eficazes, tornando todo o processo algo irrelevante.

 

O que pode ser feito para que haja espaço igualitário para todos os players?

Tendo em conta o que expliquei anteriormente parece fácil, mas infelizmente não é.

Não basta dizer que transpusemos as diretivas comunitárias, que promovemos a abertura do mercado postal à concorrência, que definimos as regras e que legislámos, se em termos práticos tais regras e tal legislação não estiver revestida de princípios de equidade, se tais regras e tal legislação não se adequarem à realidade, se tais regras e tal legislação não forem observadas no todo ou em parte pelos agentes de mercado, incluindo pelas entidades públicas clientes, que têm a obrigação de abrir o mercado à concorrência e lançar concursos regulares. Deve ser, de igual modo, fiscalizada a observância das regras e legislação em causa, não devendo ser permitido que cada player atue conforme se lhe apraz.

Se assim é, a liberalização do mercado postal é uma mera utopia, que não passou do papel.

Acreditamos que o contexto retratado, constitui um atentado efetivo aos princípios que presidiram à liberalização do mercado, impactando negativamente na concorrência, e nos benefícios que poderá aportar ao mercado e aos seus consumidores.

Um contexto que, não obstante o nosso entendimento, carece de imprescindível e premente apreciação no âmbito jus-concorrencial por parte da AdC – com quem a PGM tem estado em diálogo – bem como da imprescindível e premente apreciação da ANACOM no âmbito do quadro regulamentar em vigor, com particular ênfase para certas práticas preconizadas pelos CTT entre 2021 e 2022, que consubstanciaram as Denúncias apresentadas pela PGM às referidas autoridades e para as quais aguardamos a devida apreciação formal.

 

Como analisa o setor da logística em Portugal? Está suficientemente desenvolvido ou há ainda muito caminho a percorrer?

O setor da logística e transportes é um setor permanentemente pressionado pelas crescentes necessidades e exigências do mercado, nomeadamente ao nível da rapidez, de satisfazer de imediato, em quantidade e com qualidade em qualquer ponto do país ou do mundo.

Exige-se cada vez mais capacidade de resposta e para o efeito é fundamental apostar na tecnologia para suporte aos processos e à sua otimização, para a sua monitorização end2end, para alimentação dos sistemas de informação, das alarmísticas, do processo de gestão e de tomada de decisão, o mais em tempo real possivel, e sempre que possível “na antecipação”.

Na PGM dispomos de um conjunto de processos que nos permitem rastrear todos os serviços, desde o momento em que é expedida até ao momento em que chega ao destino final, inclusive para uma mera carta simples. Os processos e tecnologia implementados conferem-nos uma visão 360º de tudo o que acontece a todo o instante em cada etapa do processo. Uma visão diferenciadora, fundamental, imprescindível na gestão diária do negócio, das operações, do seu conhecimento, do seu controlo, da deteção e resolução preventiva de constrangimentos.

A sustentabilidade, atendendo às metas objetivadas mundialmente, é claramente um setor adicional em que, transversalmente, todos teremos de fazer um esforço e celeridades acrescidos. No nosso caso e particular estamos a procurar reforçar de forma contínua a quota de veículos elétricos no universo da nossa frota.

Haverá sempre, e felizmente, caminho a percorrer.

No entanto, acredito que o contexto de pandemia, a pressão que colocou nas cadeias de abastecimento, acelerou e contribuiu positivamente para o desenvolvimento do setor no mundo e em Portugal, não foi exceção. Quer ao nível tecnológico de controlo, gestão e capacidade de resposta dos negócios, quer ao nível das preocupações ambientai.

Mais uma vez, o espírito de missão que interiorizamos, de subsistência, de sobrevivência, de entreajuda, de apoio ao próximo, e de resposta mais que urgente foram notórios e marcaram a diferença na forma como foi gerido todo esta situação dramática.

Enquanto organização, revemo-nos indubitável neste retrato. É este o modelo que prosseguimos e perseguimos diariamente, desde a génese. que nos quer no âmbito da gestão, quer no âmbito da cultura organizacional promovida por cada um dos colaboradores e parceiros que fazem parte integrante da PGM.

 

O tema da sustentabilidade está também presente na organização?

Claro que está, 40% da nossa frota é elétrica e esse rácio irá aumentar.

A PGM será sempre muito atenta e interventiva nessa temática. De resto essa preocupação surgiu em linha as necessidades criadas pela maior consciencialização dos clientes e dos nossos decisores internos para integrar valores e missão com uma prática real e concreta, acelerada nos últimos tempos pela escalada do preço dos combustíveis fosseis.

Ainda assim, do ponto de vista de soluções, o mercado carece ainda de desenvolver a diversidade da oferta, de maior autonomia dos veículos e também maior celeridade no seu fornecimento.

 

O que diferencia a Premium Green Mail?

A Premium Green Mail (PGM) posiciona-se no mercado como “o” operador alternativo no que respeita à prestação de serviços integrados no âmbito do serviço universal, nomeadamente ao nível da distribuição de correspondência, contribuindo ativamente para um mercado mais saudável e mais competitivo.

A PGM pretende disponibilizar uma solução alternativa de mercado que constitua uma mais-valia para os seus clientes. Uma solução diferenciadora quer do ponto dos custos, os quais traduzem níveis de poupança significativos, quer do ponto de vista processual, da sua customização, da visão 360 que confere, com uma gestão comercial muito próxima, permanente, proativa, interativa, personalizada, dedicada, com vista à otimização contínua dos níveis de serviço prestados e dos níveis de satisfação do Cliente. Uma solução diferenciadora que coloca o Cliente no centro nevrálgico dos procedimentos e metodologias definidas e prosseguidas diariamente pela PGM e por toda a sua equipa.

 

Que novos conceitos podem ainda surgir no futuro do setor das entregas?

É como lhe tenho dito, o setor das entregas está constantemente a mudar, mas creio que podemos estabelecer aqui algumas ideias que marcarão o futuro do setor. Algumas, inclusive, que já começaram a impactar e aos quais as empresas que compõem o setor têm prestado especial atenção.

Falo num primeiro momento de tecnologia o que já não é recente, mas mais especificamente de inteligência artificial que poderá impactar e muito a logística do processo, ao nível da capacidade preditiva por exemplo, constituindo-se um fator diferenciador no mercado, possibilitando mais informação, uma maior capacidade de resposta e uma maior eficiência dos processos.

Na nossa área de atuação em particular, e não obstante a criticidade da tecnologia e do fator preço, sentimos que os clientes procuram soluções com uma abordagem diferente. Uma abordagem diferente no que respeita, por exemplo, à forma como se gere a relação comercial, a comunicação e a partilha de informação, a monitorização e acompanhamento, a proatividade ao nível da apresentação de propostas e resolução de constrangimentos (efeito antecipação), o compromisso, o empenho e a celeridade na resposta a toda e qualquer solicitação. Ainda que, formalmente, o parceiro seja uma extensão, externalizada, dos processos e do negócio do Cliente, em termos práticos funciona como parte integrante, do sistema interno do Cliente, alimentando, de forma inteiramente personalizada, aquelas que são as suas expetativas, necessidades e desafios de negócio fazendo de cada Cliente um Cliente único. E aqui, no âmbito do relacional, são as pessoas, as nossas, todas e cada uma, que fazem a diferença, dia após dia.

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