Justiça alemã dá três meses ao BCE para justificar “vastas compras de dívida”
O Tribunal Constitucional alemão exigiu, esta terça-feira, ao Banco Central Europeu (BCE) para no prazo de três meses justificar a conformidade do seu mandato para as vastas compras de dívida, numa sentença com implicações incertas.
O poderoso banco central alemão será proibido de participar neste programa anti-crise, que ainda ganhou mais amplitude devido à pandemia da covid-19, se “o Conselho do BCE” falhar em demonstrar “de maneira compreensiva e substancial” “que não excedeu os tratados europeus”, decidiu o Tribunal Constitucional alemão.
Com esta sentença, o Tribunal alemão declarou que o programa de compra de dívida do BCE, adotado em 2015, é parcialmente contrário à Constituição da Alemanha, mas sublinhou que “não foi capaz de estabelecer uma violação” pelo BCE da proibição de financiar diretamente os Estados europeus.
Contudo, a decisão do Tribunal, votada por uma maioria de sete contra um, indica que o programa do BCE excedeu os seus poderes sem considerar a proporcionalidade da medida como uma ferramenta para aumentar a taxa de inflação para cerca de 2%.
O Tribunal considera “duvidosa” a competência do BCE para recomprar massivamente a dívida pública, que representou a maior parte dos 2.600 mil milhões de euros de compras de obrigações operadas entre março de 3015 e dezembro de 2018, no âmbito do programa “Quantitative Easing” ou “QE” reativado em novembro de 2019.
Em particular, os magistrados alemães recusam cumprir o parecer do Tribunal de Justiça Europeu, que tinha aprovado o programa do BCE no final de 2018, e lamentam a falta de controlo do “QE” pelo Parlamento alemão.
O presidente do TC alemão, Andreas Voßkuhle, sublinhou, quando divulgou a sentença, que a Constituição da Alemanha não foi cumprida porque o Governo e o Parlamento alemão não reviram as decisões do Conselho do BCE.
A sentença proferida hoje “não diz respeito” ao programa de emergência contra a pandemia (PEPP) anunciado em meados de março pelo BCE de 750 biliões de euros até o final do ano, recordam os magistrados alemães.
O Tribunal Constitucional alemão pronunciou-se hoje sobre o programa de compra de ativos do BCE.
Os juízes de Karlsruhe pronunciaram-se sobre os “Asset Purchase Programs” (APP) criados por Mario Draghi entre 2015 e 2019 depois de um grupo de dois mil queixosos, encabeçado por economistas e professores de Direito, darem início a este processo por duvidarem que o programa respeite a lei fundamental alemã.
Os especialistas argumentam que a compra de ativos é ilegal por se tratar de financiamento monetário dos Estados-membros, uma vez que cada um dos bancos centrais da zona euro compra, com o apoio do BCE, dívida emitida pelos respetivos Estados.
Esta prática está proibida nos tratados europeus, mas o BCE argumenta que os bancos centrais da zona euro, ao comprar a dívida no mercado secundário, e não diretamente aos Estados-membros, não está a cometer qualquer ilegalidade.
Em 2017, o Tribunal Constitucional, assumiu ter dúvidas de que a compra de ativos fosse compatível com a proibição de financiamento monetário, reencaminhando a sentença para o Tribunal de Justiça Europeu (TJE).
O TJE pronunciou-se a favor do BCE e coube agora à entidade máxima de justiça alemã interpretar a sentença à luz da sua Constituição.
O programa de compra de ativos do BCE tem sido determinante para manter as taxas de juro da dívida dos países da zona euro mais endividados em níveis baixos.