‘Jogo de cadeiras’: Governo nomeou 66 dirigentes para cargos de topo em apenas quatro meses de mandato

Desde o início de maio, o Governo nomeou 66 dirigentes para cargos de topo em várias entidades nacionais, com mudanças em 24 organismos estatais e, em alguns casos, mais do que uma vez. Estas alterações, que abrangeram quase todos os ministérios, incluem nomeados com ligações ao PSD, num processo que já gerou controvérsia.

A informação foi obtida através da análise de comunicados de imprensa, decisões de conselhos de ministros e publicações no “Diário da República”.

A nomeação mais recente, anunciada ontem, segundo lista o Jornal de Notícias (JN) foi a de José Augusto Bernardes, novo comissário-geral da Estrutura de Missão para as Comemorações do V Centenário do Nascimento de Luís de Camões. O lugar tinha sido ocupado por Rita Marnoto em maio, mas, segundo o Ministério da Cultura, esta pediu a exoneração em julho. No entanto, há apenas quatro dias, Marnoto, em Cabo Verde, afirmava que ainda aguardava por “orçamento e equipa de programadores” para iniciar o trabalho, o que levanta dúvidas sobre as circunstâncias da sua saída.

Outro exemplo de sucessivas nomeações é o caso do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM). Após a demissão de Luís Meira a 1 de julho, na sequência de uma troca de acusações com o Ministério da Saúde, foi nomeado Vítor Almeida. No entanto, este também renunciou ao cargo uma semana depois, alegando falta de condições para exercer a função. Posteriormente, Sérgio Janeiro, um militar, foi designado para o cargo.

Ontem, houve ainda a nomeação de José Pulido Valente como novo presidente do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (IAPMEI), substituindo Luís Guerreiro, exonerado com o objetivo de dar um “novo impulso” à instituição.

Disputas judiciais e exonerações
Entre os organismos com mais nomeações destacam-se a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) e a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS), cada uma com seis dirigentes indicados pelo Governo, mostram as contas do JN.

Outras mudanças de liderança ocorreram em instituições como a Polícia de Segurança Pública (PSP), a Agência para a Modernização Administrativa (AIMA), a Segurança Social, a Águas de Portugal, museus, monumentos, o Instituto do Património, a Fundação INATEL, três organismos ligados ao Ministério da Defesa, a Comissão de Auxiliares da Justiça, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e diversos monumentos e teatros nacionais.

Em quase metade das situações, as nomeações implicaram a exoneração dos dirigentes em funções. O Governo tem frequentemente justificado estas decisões com a necessidade de uma “nova orientação” ou um “novo impulso”. No entanto, alguns dos dirigentes exonerados não aceitaram passivamente as suas demissões e admitem levar o caso para tribunal. Ana Jorge, ex-provedora da Santa Casa da Misericórdia, e João Dias, ex-presidente da AIMA, acusam o Governo de ter agido de forma incorreta e estão entre os que ponderam avançar com processos judiciais.

Nomeações e ligações ao PSD
Entre os nomeados destacam-se várias figuras com ligações ao Partido Social Democrata (PSD), incluindo Carmona Rodrigues, designado para a Águas de Portugal, Paulo Rios de Oliveira, nomeado vogal da AICEP, e Octávio Félix de Oliveira, que assumiu um cargo na Segurança Social. Ex-autarcas ligados ao partido também figuram entre os novos dirigentes de topo.

As substituições parecem estar a ocorrer antes de os dirigentes atingirem um ano completo no cargo, o que evita o pagamento de indemnizações. Este padrão tem sido observado em diversas nomeações, com vários dirigentes prestes a completar o mandato a serem substituídos pouco antes do prazo. Além disso, há ainda quatro cargos que aguardam decisão do Governo, incluindo o de diretora-geral da Saúde e os responsáveis pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), a NAV Portugal (gestão do tráfego aéreo) e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

O líder do PSD, Luís Montenegro, parece estar a garantir o futuro político de autarcas do partido que se encontram no final dos seus mandatos, colocando-os em posições de destaque. O primeiro exemplo foi Hernâni Dias, ex-presidente da Câmara de Bragança, e Emídio Sousa, da Feira, ambos escolhidos como secretários de Estado. Posteriormente, Hélder Sousa Silva, de Mafra, e Sérgio Humberto, da Trofa, foram eleitos para o Parlamento Europeu, após renunciarem às suas presidências municipais.

Recentemente, Ricardo Gonçalves, de Santarém, foi nomeado para liderar o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), e Benjamim Pereira, de Esposende, assumirá a liderança do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU). Ambos estavam a terminar os respetivos mandatos autárquicos.

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