Jerónimo de Sousa mantém-se num Comité Central mais jovem e pequeno: PCP inicia hoje o 22º Congresso

O PCP vai discutir a partir desta sexta-feira – e até domingo – no seu 22º Congresso, um projeto de resolução política em que analisa a situação política nacional e internacional, assim como os desafios internos do partido, e enquadra as próximas eleições.

Ao longo de 57 páginas, o partido acusa o PS de ter revelado “demissionismo” perante o Governo da Aliança Democrática (AD), considera estar a ser alvo de uma “grande e prolongada ofensiva anticomunista” e adverte que o mundo está perante “crescentes ameaças de um conflito mundial de catastróficas proporções”.

Estas Teses/Projeto de Resolução Política foram apresentadas pelo Comité Central do PCP em setembro, tendo sido submetidas a um período de discussão interna que durou cerca de dois meses e do qual resultaram cerca de 1.500 propostas de alteração, segundo indicou o partido à Lusa.

Eis alguns dos pontos essenciais da visão do PCP sobre o país e o mundo para o seu 22.º Congresso:

Governo da AD revela “determinação clara em intensificar política de direita

Na análise ao atual Governo da Aliança Democrática (PSD/CDS-PP), o PCP considera que a sua entrada em funções, “revelou, para lá da propaganda e medidas pontuais, a determinação clara de prosseguir e intensificar a política de direita”.

“Os primeiros meses de Governo confirmam que PSD e CDS, em convergência com Chega e IL, procuram levar mais longe a política de direita, ao serviço do grande capital, de ataque aos direitos dos trabalhadores, de agravamento da exploração, de entrega dos serviços públicos aos negócios privados, de privatizações, de privilégios aos grupos económicos”, refere-se.

PS mostra “demissionismo” perante Governo e “incómodo” com ‘geringonça’

Apesar de, em 2020, o PCP já criticar as opções políticas do PS – que acusava de ter impedido mais avanços durante a ‘geringonça’ e de estar comprometido “com o grande capital” -, agora acusa-o “demissionismo” para “enfrentar as opções do atual Governo e maioria”.

“A política de direita encontrou no PS um percurso e opções que, não descolam, no que é essencial aos interesses do capital, das que são partilhadas por PSD, CDS, Chega e IL, independentemente de fabricadas discordâncias e confrontos verbais”, lê-se nas teses.

O PCP acusa o PS de ter revelado “incómodo” perante ao período da ‘geringonça’ e de ter assumido, após 2019, “um posicionamento de resistência e recusa de resposta aos problemas”.

Numa análise ao Governo de maioria absoluta do PS, entre 2022 e 2024, o PCP considera que os socialistas confirmaram a sua política “de orientações que vão da degradação dos serviços públicos ao ataque ao Serviço Nacional de Saúde, da manutenção das normas gravosas da legislação laboral ao favorecimento dos lucros da banca, do apoio aos grupos económicos à inércia na resposta aos problemas da habitação”.

Chega e IL correspondem ao “elevar do confronto do grande capital” com democracia”

À semelhança da análise que fazia em 2020 – um ano depois de a IL e o Chega terem conseguido eleger, pela primeira vez, um deputado cada à Assembleia da República -, o PCP continua a qualificar o Chega e a Iniciativa Liberal (IL) como “sucedâneos do PSD e do CDS” e a associar os dois partidos a conceções reacionárias.

No entanto, ao invés do que acontecia em 2020, o PCP considera que tanto o Chega como a IL, apesar de “partilharem integralmente” a política do PSD e do CDS, estão a “beneficiar do engano a que muitos são conduzidos pela sua demagogia, e correspondem ao elevar do confronto do grande capital com o regime democrático”.

Teses deixam de mencionar Bloco de Esquerda, Livre e PAN

Contrariamente às Teses/Projeto de Resolução Política levados ao XXI Congresso do PCP – em que se analisava individualmente cada partido político com assento parlamentar -, no documento atual os comunistas não fazem qualquer menção ao Bloco de Esquerda, Livre ou PAN.

Marcelo procura “garantir condições favoráveis” à política de direita”

O PCP critica a atuação do Presidente da República, cujo posicionamento considera ser “marcado por uma convergência objetiva com desenvolvimentos que, no plano político e institucional, concorrem para garantir condições favoráveis ao prosseguimento da política de direita a par de um exercício que, também no plano da política externa, o confronta com o que a Constituição estipula e lhe cabe cumprir e fazer cumprir”.

Em 2020, o partido já era crítico da atuação de Marcelo Rebelo de Sousa, acusando-o de estar a “procurar favorecer uma aproximação formal entre PS e PSD favorável a um desenvolvimento menos condicionado das opções que têm marcado a política de direita”.

País enfrenta “momento decisivo” entre projeto contrarrevolucionário e forças de Abril

Em traços gerais, da análise à situação política nacional que o PCP traça antes do XXII Congresso, sobressai a ideia de que o país está perante um “momento decisivo” da vida política nacional – expressão que tem sido utilizado pelo secretário-geral do PCP – que põe em confronto “os que ambicionam concluir o processo contrarrevolucionário e as forças que, ancoradas em Abril e na Constituição, lhe resistem”.

Esse confronto, para o partido, “marca e determinará a evolução do país nos tempos mais próximos”, pelo que “a luta pela rutura com a política de direita” e o caminho para “uma alternativa patriótica e de esquerda” é atualmente a “questão central” para o país.

Mundo está perante “crescentes ameaças de conflito mundial de catastróficas proporções

Apesar de, em 2020, o PCP já considerar que a situação internacional era marcada “por uma grande instabilidade e incerteza, com a multiplicação de focos de tensão e de ações de agressão promovidas pelo imperialismo”, nas teses deste ano, o partido considera que essa situação se agravou.

O PCP salienta que se está atualmente perante um “exacerbar das tensões internacionais e crescentes ameaças de um conflito mundial de catastróficas proporções”, criticando em particular os Estados Unidos que, “com os seus aliados, avançam no militarismo e na corrida aos armamentos, instrumentalizam forças fascistas e terroristas, generalizam focos de tensão e de desestabilização, fomentam a ingerência, a agressão e a guerra, numa estratégia que representa a mais séria ameaça à paz no mundo”.

Enquanto, em 2020, o partido identificava uma “perigosa escalada de confrontação promovida pelos Estados Unidos contra a República Popular da China”, agora o PCP salienta que, além dessa “crescente tensão e provocação contra a China”, se verifica uma “estratégia de cerco e confrontação com a Rússia” e um “posicionamento cúmplice e hipócrita assumido pelos Estados Unidos e a UE face ao massacre em curso na Palestina”.

PCP considera que está a ser alvo de “grande e prolongada ofensiva anticomunista”

A nível interno, o PCP considera que, desde o último Congresso do partido, em 2020, a “ofensiva anticomunista” que já identificava na altura ganhou uma nova dimensão e “teve momentos de particular intensidade”, em particular durante a pandemia de covid-19, o anúncio do voto contra o Orçamento do Estado para 2022 e perante as várias tomadas de posição do partido sobre questões internacionais.

O partido considera que essa “ofensiva anticomunista” ganhou particular vigor perante “a posição clara de denúncia da escalada da guerra e de exigência da paz na Ucrânia, da rejeição da denúncia das ações de desestabilização e ingerência do imperialismo norte-americano e da reafirmação da solidariedade com os povos, nomeadamente com a Venezuela bolivariana”.

Partido reconhece “redução da influência eleitoral” mas destaca “resistência”

Desde o último Congresso, o PCP disputou oito eleições e, nestas teses, o partido reconhece que “nesses processos se manifestou uma redução da influência eleitoral do partido, mas, ao mesmo tempo, evidenciou-se uma resistência face aos ambicionados objetivos da operação que contra ele os seus inimigos desencadearam”.

O partido refere que “a influência eleitoral do PCP ao longo do tempo tem evoluções de sentido diverso, com avanços e recuos, que importa ter em conta numa linha de afirmação, resistência e avanço”.

“O PCP teve de enfrentar um prolongado enquadramento caracterizado pela hostilidade e menorização, pela continuada falsificação de posicionamentos para alimentar preconceitos e estreitar o seu espaço de crescimento, pela promoção de forças e conceções reacionárias, pelo favorecimento mediático de outros e por forjadas dinâmicas bipolarizadoras”, denuncia o partido.

PCP quer “consolidar” projeto da CDU nas autárquicas e ter “intervenção própria nas presidenciais”

Numa análise às próximas eleições, o PCP diz que, nas autárquicas de 2025, irá intervir “para afirmar e consolidar o projeto de trabalho, honestidade e competência consubstanciado pela CDU no poder local”.

Já para as presidenciais de 2026, garante que “terá uma intervenção própria sobre o modo como vê e defende o exercício das funções de Presidente da República, contribuindo para que se assegure, a partir deste órgão de soberania, o respeito e cumprimento da Constituição da República Portuguesa”.

Número de militantes caiu, mas contas melhoraram

A nível interno, verifica-se que o partido perdeu cerca de dois mil militantes entre 2020 e 2024: enquanto, no último Congresso, o partido tinha 49.960 membros, esse número é agora de 47.612.

Nas teses, o partido justifica essa redução com o facto de o número de recrutamentos (3.452 novos militantes) “não ter compensado aqueles que deixaram de ser contabilizados como membros do partido, em particular por falecimentos”, e que rondam os cinco mil.

Apesar desta perda de militantes, o PCP aparenta contudo ter melhorado as suas contas. Enquanto em 2020, se identifica nas Teses um “resultado financeiro negativo médio anual de 310 mil euros” nas contas do partido, agora o PCP refere que, nos últimos quatro anos, “foi possível ter os meios necessários para a obtenção de um resultado positivo”, sem especificar a quantia.

Jerónimo de Sousa mantém-se no Comité Central que será mais pequeno e mais jovem

O ex-secretário-geral do PCP Jerónimo de Sousa vai manter-se no Comité Central do partido, de acordo com a lista que vai a votos no 22.º Congresso do partido, que consagra uma direção com menos membros e mais jovem.

De acordo com a lista publicada no Avante!, jornal oficial do PCP, o Comité Central do PCP passará a ter uma ligeira redução nos membros, passando dos atuais 128 para 125.

No total, vão entrar 25 novos membros no Comité Central e sair 28, entre os quais a ex-deputada comunista Alma Rivera, que deixou a bancada parlamentar do partido nas últimas legislativas ao não conseguir a eleição enquanto cabeça de lista pelo círculo eleitoral de Évora.

Entre os membros do Comité Central que integram órgãos executivos do PCP (Comissão Política ou Secretariado), os únicos que vão deixar a direção comunista são Armindo Miranda e João Dias Coelho (ambos da Comissão Política), mantendo-se todos os restantes, o que parece sugerir uma continuidade no ‘núcleo duro’ da direção comunista.

O antigo secretário-geral do PCP Jerónimo de Sousa – que, em entrevista à Rádio Renascença divulgada esta segunda-feira tinha dito que esperava dedicar-se a partir de agora a uma tarefa “mais ligeirinha” – irá manter-se no Comité Central, caso esta proposta seja aprovada no Congresso. Com 77 anos, será o membro mais velho do Comité Central.

Também o eurodeputado João Oliveira, o vereador e ex-candidato presidencial João Ferreira, a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, o deputado António Filipe, o ex-vereador de Loures Bernardino Soares, e o secretário-geral da CGTP, Tiago Oliveira, estão entre os 100 membros que se irão manter no órgão máximo do PCP entre congressos, de acordo com esta lista.

Entre os 25 novos membros, consta Tânia Mateus, técnica superior de 45 anos, que, em outubro, assumiu temporariamente o cargo de deputada na Assembleia da República, em substituição de Paulo Raimundo, que tinha interrompido o seu mandato para usufruir da licença de paternidade.

Em termos demográficos, a nova direção comunista será ligeiramente mais jovem, com a média de idades a baixar dos atuais 49 anos para 48. Essa redução deve-se a um aumento do número de membros até aos 30 anos (que passam de seis para oito) e, sobretudo, a uma redução no número de dirigentes com mais de 60 anos (passam de 31 para 24).

Já relativamente à paridade de género, o Comité Central passará a ter 37 mulheres – contra as 35 atuais -, o que se traduz num aumento da proporção, com 29,6% dos membros a serem mulheres (atualmente eram 27,3%). Este aumento deve-se ao facto de a maior parte dos novos membros (13 entre os 25) serem mulheres.

No Avante, lê-se que esta lista foi aprovada numa reunião do Comité Central que se realizou no fim de semana e será agora submetida à votação no 22.º Congresso do PCP.

A lista consagra assim os critérios definidos pelo Comité Central do PCP nas Teses/Projeto de Resolução Política para a próxima direção comunista: mais pequena, com mais jovens e mulheres.

Em entrevista à agência Lusa no início deste mês, Paulo Raimundo tinha antecipado que iria haver uma “redução ligeira” do número de membros do Comité Central, com vista sobretudo a agilizar o funcionamento do órgão e tornar as suas reuniões mais operacionais.

Relativamente ao número de mulheres, Paulo Raimundo também tinha referido que iria aumentar, mas admitiu que o partido não iria conseguir atingir a taxa que deseja, designadamente garantir que a proporção de mulheres na direção corresponde à da generalidade dos membros do partido, de 33%.