
Foi ‘mais lenha na fogueira’? Ofensiva israelita no Irão poderá ter aproximado Teerão da arma nuclear
Cinco dias após o início da guerra entre Israel e o Irão, os ataques israelitas sobre instalações nucleares e infraestruturas estratégicas iranianas levantam dúvidas sobre se, em vez de travar, terão acelerado a corrida de Teerão ao armamento nuclear. A operação, que começou a 12 de junho com bombardeamentos contra o programa atómico do Irão, já destruiu, segundo as Forças Armadas israelitas, cerca de um terço das plataformas de lançamento de mísseis balísticos e deixou as defesas aéreas iranianas praticamente desmanteladas.
De acordo com informações veiculadas pelo El Confidencial, Israel bombardeou esta segunda-feira bairros residenciais na capital iraniana, Teerão, e diversas bases militares. As operações incluíram o apelo, em farsi, à evacuação de civis de várias zonas, transmitido em direto pela televisão iraniana. As forças israelitas afirmam ter eliminado grande parte da capacidade ofensiva de Teerão, mas os analistas dividem-se quanto ao impacto real nos planos nucleares iranianos.
Imagens de satélite analisadas pelo Institute for Space and International Security revelam danos consideráveis em infraestruturas à superfície das centrais de Natanz e Isfahan, dois dos principais polos do programa nuclear iraniano. Existem indícios de que sistemas elétricos críticos foram destruídos, o que poderá ter provocado falhas em cascata que inutilizaram dezenas de turbinas de enriquecimento de urânio. Contudo, os especialistas alertam que é cedo para uma avaliação definitiva: poderão ser necessárias semanas para determinar com exatidão a extensão dos estragos.
A central de Fordow, o mais protegido dos complexos nucleares iranianos por estar instalada no interior de uma montanha, terá escapado incólume aos bombardeamentos. A Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) confirma que Fordow não sofreu danos significativos. James M. Acton, codiretor do Programa de Política Nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, sublinha: “Se Fordow continua operacional, os ataques israelitas pouco fizeram para travar o caminho do Irão rumo à bomba”.
Por seu lado, Ali Vaez, do International Crisis Group, acrescenta: “Se o Irão conseguiu transferir parte do material enriquecido para instalações secretas, Israel terá falhado o seu principal objetivo”.
A ameaça permanece
Os peritos recordam que a posse de urânio enriquecido é apenas um dos passos necessários para a construção de uma arma nuclear. É também indispensável dispor de tecnologia para transformar o material em metal, moldá-lo e integrá-lo num dispositivo, processo que será particularmente complexo num cenário de guerra aberta e sob pressão internacional. Antes dos ataques, as agências de inteligência ocidentais estimavam que o Irão necessitaria de vários meses para concluir a produção de uma ogiva nuclear.
Ainda assim, o Irão mantém um importante corpo de cientistas e técnicos especializados. Israel confirmou a eliminação de Fereydoun Abbasi, antigo diretor da Organização de Energia Atómica do Irão, e de Mohammad Mehdi Tehranji, físico e presidente da Universidade Islâmica Azad, além de diversos comandantes militares. Contudo, os analistas consideram que estas perdas, por mais simbólicas que sejam, não bastarão para paralisar o projeto nuclear, enquanto o país preservar quadros técnicos qualificados e motivados.
O dilema estratégico: travar ou incentivar o Irão?
Para além dos danos materiais, a grande incógnita é o impacto psicológico e político dos bombardeamentos. O governo iraniano já anunciou, através do Parlamento, a preparação de um projeto de lei para abandonar o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), sinalizando um endurecimento da postura face ao Ocidente. “Os ataques israelitas podem atrasar o Irão no plano técnico, mas politicamente aproximam-no ainda mais do caminho das armas nucleares”, alerta Kelsey Davenport, da Arms Control Association.
Por outro lado, se os danos ao seu aparelho militar e às suas infraestruturas estratégicas forem mais severos do que inicialmente estimado, Teerão poderá ver-se compelido a reconsiderar a escalada. A quase destruição das suas defesas aéreas abre caminho a ataques mais devastadores sobre sectores vitais como o petróleo e o gás, pilares económicos do regime. Esta pressão poderá empurrar o Irão para a mesa das negociações, num esforço para preservar o que resta das suas capacidades estratégicas.
Uma guerra com impacto incerto
A ofensiva israelita está a demonstrar eficácia tática e operacional. Contudo, como recorda o El Confidencial, o grande enigma permanece: poderá uma ação militar isolada — mesmo com eventual apoio dos Estados Unidos — conter de forma duradoura o programa nuclear do Irão? O desfecho desta operação poderá determinar o futuro da segurança no Médio Oriente e reconfigurar o equilíbrio de forças na região.
À medida que os caças israelitas continuam a operar com relativa liberdade no espaço aéreo iraniano, o mundo assiste com apreensão ao que poderá ser um ponto de viragem decisivo: o momento em que o Irão, sob ataque, se sinta compelido a obter, finalmente, uma arma nuclear.