Fica com fome após beber refrigerantes ‘light’ ou ‘zero açúcares’? É esta a justificação
Um novo estudo científico publicado na prestigiada revista Nature Metabolism alerta para os efeitos inesperados dos refrigerantes dietéticos no controlo da fome, particularmente entre pessoas com obesidade. A investigação, liderada pela médica e investigadora Kathleen Page, diretora do Instituto de Investigação sobre Diabetes e Obesidade da Universidade do Sul da Califórnia (USC), conclui que os adoçantes sem calorias – como a sucralose, a stevia, o aspartame e o eritritol – podem interferir com os mecanismos cerebrais que regulam o apetite, acabando por estimular a ingestão alimentar.
“O cérebro espera receber calorias quando deteta um sabor doce, mas com estes adoçantes isso não acontece. Como resultado, o cérebro ativa mecanismos que aumentam o apetite para compensar essa ausência de calorias”, explicou o Dr. Nicholas Pennings, médico de família e especialista em obesidade, além de diretor do Centro de Saúde da Universidade de Campbell, em declarações ao HuffPost.
Segundo o estudo, os efeitos dos adoçantes artificiais não são sentidos da mesma forma por todas as pessoas. Kathleen Page salienta que tanto as mulheres como as pessoas com obesidade apresentam respostas cerebrais mais marcadas a estas substâncias. “As pessoas com obesidade registaram uma resposta particularmente forte no hipotálamo, a zona do cérebro responsável por regular a fome”, indicou a investigadora. Esse desfasamento agrava a probabilidade de estas pessoas comerem em excesso, mesmo após consumirem bebidas teoricamente inócuas em termos calóricos.
Apesar de as razões para esta maior sensibilidade cerebral ainda não serem totalmente compreendidas, Page considera que pode tratar-se de “uma questão do tipo ovo ou galinha”, ou seja, não se sabe se a maior reatividade é causa ou consequência da obesidade.
O cirurgião bariátrico Héctor Perez, da Renew Bariatrics, reforçou essa ideia. “A obesidade não é apenas excesso de peso visível. Muitas funções do corpo são alteradas, incluindo o modo como o cérebro reage aos alimentos. Isso explica porque certas pessoas reagem de forma tão acentuada aos adoçantes”, afirmou.
Evitar adoçantes para compreender melhor os sinais de fome
Para quem deseja compreender melhor os seus sinais de fome ou evitar episódios de compulsão alimentar, os especialistas recomendam reduzir – ou eliminar – o consumo de refrigerantes dietéticos e outros produtos com adoçantes não calóricos.
Nicholas Pennings foi mais longe e sugeriu evitar tanto o açúcar como os adoçantes. “O açúcar está associado ao aumento de peso, mas os adoçantes artificiais podem levar a comer mais do que o necessário, anulando qualquer benefício calórico”, disse ao HuffPost.
Além dos adoçantes, outros fatores também podem distorcer os sinais de fome. A confusão entre sede e fome é um deles. “Os sinais corporais para fome e sede podem sobrepor-se. Manter-se hidratado pode ajudar a evitar lanches desnecessários”, explicou Héctor Perez. A falta de nutrientes saciantes – como proteínas, fibras, gorduras insaturadas e hidratos de carbono complexos – também contribui para a fome constante, assim como o sono insuficiente, o stress elevado e os hábitos de alimentação distraída, como comer frente ao computador ou à televisão.
Comer com atenção: uma prática a recuperar
Para combater estes fatores, Perez defende a adoção de uma alimentação mais consciente: “Mastigue devagar, saboreie cada garfada e vá verificando ao longo da refeição se ainda está com fome. Com o tempo, esta prática ajuda a recuperar a confiança nos sinais naturais de fome e promove hábitos mais saudáveis.”
Caso os episódios de fome constante persistam, o médico recomenda uma consulta médica, uma vez que algumas condições de saúde ou medicamentos – como antidepressivos ou fármacos para a tensão arterial – podem alterar os mecanismos naturais do apetite.
No mundo ideal, onde todos dormem bem, não vivem stressados, comem de forma equilibrada e evitam substâncias artificiais, o cérebro consegue comunicar claramente quando se está com fome ou saciado. Porém, como isso raramente corresponde à realidade do quotidiano, entender melhor os sinais do corpo implica esforço – e, segundo os especialistas, reduzir o consumo de refrigerantes dietéticos é um bom ponto de partida.