Fenómeno intriga cientistas: Vulcão na Antártida ‘cospe’ milhares de euros em ouro todos os dias
Na remota Ilha de Ross, no coração da Antártida, o monte Erebus — o vulcão ativo mais a sul do planeta — surpreende a comunidade científica com uma descoberta insólita: as suas emissões contêm partículas microscópicas de ouro. De acordo com estudos realizados, o vulcão poderá estar a libertar até 80 gramas de ouro por dia, um valor que, embora sem viabilidade económica, equivale a cerca de seis mil euros, dependendo da cotação do metal precioso.
Com uma altitude de 3.794 metros, o Erebus destaca-se não só pela sua localização extrema, mas também por manter, há mais de cinquenta anos, um lago de lava permanente — um fenómeno raríssimo no panorama vulcânico mundial. Esta combinação de condições extremas e estabilidade interna permitiu aos investigadores monitorizar o comportamento das emissões gasosas durante décadas, tendo agora sido confirmado que o vulcão “cospe” pó de ouro, transportado pelos ventos até mais de mil quilómetros de distância.
As partículas metálicas foram detetadas em análises atmosféricas realizadas em vários pontos da Antártida, o que demonstra a ampla dispersão deste material no ar. Para os cientistas, este fenómeno representa uma oportunidade única para estudar a dinâmica dos metais pesados em zonas polares e as implicações geológicas e atmosféricas da atividade vulcânica em ambientes extremos.
Um laboratório natural no “fim do mundo”
O monte Erebus tem vindo a ser monitorizado desde o final dos anos 1970, e os primeiros indícios da presença de metais nas suas emissões datam de há mais de três décadas. Contudo, só recentemente foi possível quantificar com maior precisão o volume de ouro expelido. Os investigadores alertam, no entanto, que a concentração — por mais curiosa que seja — não permite qualquer exploração comercial. “Estamos a falar de partículas microscópicas, que se dispersam rapidamente. Não é possível recolhê-las de forma viável”, sublinham os geólogos envolvidos.
Apesar disso, a existência deste “pó dourado” abriu novas linhas de investigação sobre os processos internos de formação de metais preciosos em ambientes vulcânicos e a forma como estes se libertam na atmosfera. Em entrevista ao canal norte-americano ABC News, investigadores sublinham que este tipo de fenómeno pode contribuir para “compreender melhor os ciclos geológicos e químicos que moldam o nosso planeta”.
Tragédia histórica e cenário de mudanças climáticas
O monte Erebus foi também palco de uma das maiores tragédias aéreas da história recente. A 28 de novembro de 1979, o voo 901 da Air New Zealand despenhou-se nas encostas do vulcão, matando as 257 pessoas a bordo. As investigações concluíram que um fenómeno de whiteout — uma ilusão ótica causada pela reflexão da neve e nuvens — impediu os pilotos de distinguir o relevo montanhoso do céu, contribuindo diretamente para o acidente.
Além do seu interesse científico e histórico, o Erebus é hoje observado com crescente preocupação devido aos efeitos das alterações climáticas. O aquecimento global e o derretimento progressivo das camadas de gelo estão a alterar a pressão exercida sobre as câmaras magmáticas subglaciares. Segundo especialistas, estas alterações podem provocar um aumento da atividade vulcânica em zonas como a Antártida Ocidental, com potenciais consequências para o equilíbrio ambiental do planeta.
“O que antes era considerado um sistema estável pode tornar-se um agente ativo na aceleração do recuo do gelo e na subida do nível do mar”, alerta José Pichel, especialista em geodinâmica polar, citado em vários estudos recentes.
O monte Erebus continua a ser um enigma vulcânico. A sua atividade constante, aliada à descoberta de emissão de ouro, reforça a importância da investigação científica na região antártica, sobretudo num momento em que as consequências do aquecimento global se tornam cada vez mais visíveis.
Embora o ouro que o vulcão cospe todos os dias não possa ser recolhido, a sua presença é um lembrete da riqueza mineral escondida sob o gelo e da complexidade dos processos geológicos em ambientes extremos. No limite do mundo habitável, o Erebus continua a lançar lava — e agora também ouro —, oferecendo um vislumbre raro dos segredos mais profundos da Terra.