
Ensino Superior: Portugal tem a sétima propina mais cara da União Europeia, revela estudo
Portugal continua a destacar-se na Europa pelos elevados custos associados ao ensino superior. De acordo com um estudo da Associação Académica de Coimbra (AAC), a propina média no país, atualmente fixada em 697 euros por ano, é quase o dobro da média europeia, que se situa nos 381 euros.
O relatório, intitulado Estudo Comparativo dos Custos Associados à Frequência do Ensino Superior na União Europeia, revela ainda que Portugal tem a sétima propina mais elevada entre os Estados-membros da União Europeia (UE). Segundo o vice-presidente da AAC, José Machado, em declarações ao Jornal de Notícias (JN) esta realidade não se justifica, uma vez que a maioria dos países que aderiram à UE após Portugal já implementaram um sistema de ensino gratuito ou praticam valores muito mais acessíveis.
Além dos custos das propinas, o estudo sublinha outro fator preocupante: o fraco investimento governamental no apoio aos estudantes, que em Portugal continua abaixo da média europeia.
A consequência mais imediata deste cenário é o aumento do número de estudantes portugueses que optam por frequentar o ensino superior no estrangeiro. Carlos Magalhães, presidente da AAC, afirma que esta tendência já se verifica em países como Espanha, pela proximidade geográfica e cultural, mas também noutros países da Europa, onde os custos podem ser mais baixos e as condições mais atrativas.
Outro dado alarmante do estudo é o valor das propinas aplicadas a estudantes internacionais em Portugal. O país ocupa o segundo lugar no ranking das propinas mais caras para estudantes estrangeiros, com um valor médio de 7 mil euros por ano, ficando apenas atrás de Malta, onde a propina atinge os 8.500 euros anuais.
Apoios estatais abaixo da média europeia
O relatório da AAC evidencia ainda as dificuldades dos estudantes no acesso a apoios financeiros. Em Portugal, os apoios governamentais médios por estudante são de apenas 872 euros por ano, um valor significativamente inferior à média europeia, que se situa nos 2.336,77 euros.
“A tendência europeia demonstra um forte investimento no apoio aos estudantes, enquanto Portugal mantém um modelo de financiamento mais restritivo, o que pode ter consequências negativas no acesso e na equidade no ensino superior”, alerta o estudo.
A nível macroeconómico, os gastos públicos no ensino superior em Portugal representam apenas 0,9% do PIB, enquanto a média da União Europeia se situa nos 1,17%.
O relatório analisou ainda outros fatores socioeconómicos que influenciam o custo de vida dos estudantes, incluindo o salário mínimo, o salário médio, o PIB per capita, o preço médio da habitação e o índice do custo de vida em cada Estado-membro.
Carlos Magalhães considera que há “dados gritantes” no estudo, referindo, em particular, os elevados custos da habitação, que dificultam ainda mais a permanência dos estudantes no ensino superior. “Os custos para qualquer tipo de estudante são quase insustentáveis ao longo do seu percurso académico”, afirma.
Estudantes exigem mais investimento no ensino superior
Paralelamente ao estudo, a AAC realizou um inquérito entre 30 de janeiro e 10 de fevereiro, que contou com a participação de 1.561 estudantes. Os resultados refletem um descontentamento generalizado: quase 89% dos inquiridos consideram que é necessário um maior investimento financeiro e político no ensino superior, enquanto apenas 5,3% discordam dessa necessidade.
Quanto à qualidade do ensino em relação ao valor das propinas, 48,9% dos estudantes consideram que o valor pago não corresponde à qualidade oferecida, enquanto 35,7% avaliam o custo como adequado.
A acessibilidade do ensino superior português face a outros países europeus também divide opiniões: 37,2% dos inquiridos acreditam que estudar em Portugal não é mais acessível do que estudar no estrangeiro, enquanto 32,1% consideram que sim e 30,7% não têm opinião formada.
O estudo revela ainda que 57% dos estudantes dizem que enfrentariam restrições socioeconómicas caso decidissem estudar noutro país europeu, enquanto 29,9% admitem que “talvez” tivessem dificuldades e 8,3% consideram que não enfrentariam qualquer problema financeiro para estudar fora de Portugal.
Recomendações do estudo: ensino gratuito e mais apoios sociais
Perante as conclusões do estudo, a AAC recomenda um aumento urgente do financiamento público no ensino superior, propondo um modelo de gratuitidade progressiva das propinas, bem como a revisão da Lei de Bases da Ação Social Escolar.
O documento sugere ainda o reforço das parcerias entre instituições de ensino superior e o mercado de trabalho, para garantir uma melhor integração dos estudantes no mundo profissional.
Carlos Magalhães defende que o objetivo deve ser um ensino gratuito, mas com uma redução gradual das propinas ao longo de três anos, num modelo sustentável e viável para o Governo.
Outra prioridade apontada pela AAC é a revisão do sistema de atribuição de bolsas de estudo. “A nossa primeira proposta é que o valor das bolsas acompanhe a inflação, ou seja, que passe dos atuais 872 euros para 1.060 euros, e que seja revista toda a estrutura de atribuição e alargamento das bolsas, tendo como referência dois terços do salário mínimo”, detalha o presidente da AAC.
O próximo passo da associação estudantil será apresentar este estudo a diferentes entidades políticas e governamentais, incluindo partidos e membros do Governo, numa tentativa de impulsionar mudanças concretas no financiamento do ensino superior em Portugal.