«É fundamental que se faça uma aposta forte na capacitação digital»

A transformação digital constitui um dos pilares do processo de recuperação pós-pandemia, o que demonstra a relevância que o digital assume actualmente e que se consubstancia numa sociedade e economia cada vez mais ligadas à inovação e tecnologia. Em entrevista à Executive IT, Luísa Ribeiro Lopes, presidente do Conselho Directivo do .PT, explica os principais desafios desta nova era para as empresas e cidadãos.

O número de domínios registados (.pt) aumentou bastante durante a pandemia.

O que prevê para 2022? A nossa previsão é que a tendência crescente do número de registos se mantenha em 2022, se compararmos com os dados de que dispomos relativamente ao período pré- -pandemia. Durante os últimos dois anos, o registo de novos domínios em .pt atingiu níveis recorde, em resultado de um contexto excepcional de confinamento que estimulou a transformação digital e que permitiu que negócios e serviços mantivessem a sua actividade. No entanto, não devemos esquecer que, mesmo antes da pandemia, era já notória a adopção de um modelo de negócio mais orientado para o digital por parte das empresas, a par de um maior fluxo nos canais digitais gerado pelos utilizadores da internet. A pandemia veio simplesmente acelerar esta tendência e, por conseguinte, o ecossistema digital foi alargado, enquanto os utilizadores da internet desenvolveram uma maturidade digital por começarem a fazer cada vez mais operações dentro do ambiente online. Assim, acreditamos que a presença no digital continuará a ser decisiva nos próximos anos para as empresas que pretendam manter-se competitivas num mercado cada vez mais global, e que esta aposta no digital será reflectida no número de registos em .pt.

Esse crescimento gerou novos riscos?

Um dos principais riscos inerentes a este crescimento prende-se com o desafio da cibersegurança. Há muito trabalho a fazer do ponto de vista dos ataques às infra-estruturas corporativas das organizações, mas também entre os mais desprotegidos que agora se estreiam no digital e não conhecem os perigos. É um trabalho de prevenção e capacitação dos cidadãos, por um lado, e de protecção e regulação, por outro, que tem dado sinais positivos não só no nosso País como na Europa, onde a transformação digital tem sido prioridade. Neste âmbito, o .PT criou o seu Centro de Operações de Segurança – PTSOC – para acelerar a capacidade de resposta a incidentes e ameaças de cibersegurança. Por outro lado, em parceria com o Centro Nacional de Cibersegurança, desenvolveu a Webcheck.pt, uma plataforma online que permite aos utilizadores verificar, em tempo real, o nível de conformidade de um domínio de internet e de um email com os mais recentes standards para a comunicação segura entre sistemas, e integra o conselho de acompanhamento do Centro Internet Segura.

E quais os principais desafios?

O maior desafio é, sem dúvida, não deixar ninguém para trás neste processo de transformação digital. Num País onde predominam as pequenas e médias empresas e 18% da população está excluída digitalmente, é preciso trabalhar no desenvolvimento das competências digitais dos cidadãos com rapidez e consistência. Tal só é possível através de um esforço conjunto por parte do Governo e de outras entidades, de forma a serem criadas as condições necessárias para combater este novo analfabetismo e fazer com que as empresas, incluindo as mais tradicionais, transitem com sucesso para o digital. A transformação digital das empresas constitui um dos pilares do processo de recuperação pós- -pandemia, o que demonstra a relevância que o digital assume actualmente e que se consubstancia numa sociedade e economia cada vez mais ligadas à inovação e tecnologia. Neste âmbito, exis- tem duas iniciativas que estão a fazer toda a diferença, e que contam com o apoio do .PT: o Comércio Digital, que desafia as empresas a dar o salto para o universo online, e o EUSOUDIGITAL, que promove a capacitação digital de um milhão de portugueses com o apoio de voluntários e centros de aprendizagem por todo o País.

Considera que esta revolução digital abre possibilidades na retenção de talento português?

A transformação digital oferece inúmeras possibilidades para que Portugal consiga reter o seu próprio talento e, além disso, atrair talento estrangeiro. Pela primeira vez na nossa história, estamos a iniciar uma revolução a par dos restantes países pioneiros na inovação e tecnologia. Com uma sólida infra-estrutura tecnológica, recursos altamente qualificados na área das tecnologias e com aptidões linguísticas, Portugal reúne as características de uma digital nation e que o tornam num País tão apelativo para a criação de hubs tecnológicos por parte de empresas estrangeiras. O talento tecnológico é necessário para que as empresas continuem a evoluir e o País se mantenha na dianteira da tecnologia. Ainda que as novas tecnologias sejam as principais protagonistas da revolução digital, esperamos que esta traga uma alteração profunda ao nível do mercado de trabalho, tornando-o mais competitivo. Mais concretamente, esta reestruturação do mercado de trabalho deve traduzir-se na criação de emprego mais qualificado, mais estável, e com salários mais atractivos, que permitam a Portugal não só formar, mas também captar e reter os portugueses que pretendam crescer profissionalmente no nosso País. Nesse aspecto, o Plano de Recuperação e Resiliência – e também aqui Portugal de- monstra ser inovador ao conferir uma aplicação de cariz social, através de um plano global europeu – pode consistir num aliado por incentivar a criação de emprego e o desenvolvimento de com- petências para a inovação e tecnologia.

A população portuguesa tem uma fatia de 18% de iliteracia digital. O que nos cabe fazer (empresas e cidadãos) para atacar a exclusão digital?

O processo de transformação digital não termina enquanto não se colocar um fim à exclusão digital. As tecnologias digitais podem estar ao nosso serviço, mas se os cidadãos não desenvolverem competências digitais nunca poderão participar na economia digital. É fundamental que se faça uma aposta forte na capacitação digital, através de uma educação e qualificação mais orientadas para o digital, que lhes permita tomar decisões informadas com o suporte das tecnologias a que tenham acesso e que aporte mais valor para as empresas. Acreditamos também que podemos combater o fosso digital através de uma abordagem mais casuística, de forma a identificar as necessidades de cada um. Só assim conseguiremos dar uma resposta mais efectiva, com uma solução concreta e adequada ao problema da exclusão digital. Nesse sentido, todos nós (em- presas ou cidadãos) temos um papel a desempenhar na construção de um futuro mais digital e mais inclusivo, seja nos nossos locais de trabalho ou no seio da sociedade em que vivemos, através de iniciativas que promovam o desenvolvimento das competências digitais necessárias para que as pessoas possam compreender e passar a fazer parte do mundo online. A Iniciativa Nacional Competências Digitais e.2030, INCoDe.2030, que apoiamos, é uma importante acção integrada de política pública dedicada ao reforço de competências digitais dos portugueses.

O que podem as empresas fazer para atrair e reter mais talento feminino nas áreas tecnológicas?

No mais recente Índice de Digitalidade da Economia e da Sociedade, de Novembro de 2021, a percentagem de mulheres especialistas em TIC aumentou consideravelmente, de 18% para 22%, acima da média da UE, que é de 19%, havendo, no entanto, como os números tão desequilibrados demonstram, um longo caminho a percorrer. Às empresas cabe o importante papel de criar mudanças positivas que tornem o sector mais inclusivo, diverso, e mais equitativo, sendo igualmente fundamental sensibilizar a comunidade estudantil, de modo a desconstruir a ideia de que o mundo tecnológico pertence somente aos homens. Para tal, as empresas de- vem dirigir-se às jovens estudantes para ajudá-las a descobrir a sua vocação profissional. Uma vez que na maioria dos casos não têm referências femininas nas áreas tecnológicas, particularmente em posições de liderança, o apoio das empresas através de acções de formação e programas de mentoria é determinante para que as jovens encarem as áreas tecnológicas como um destino possível para o seu futuro. O programa Engenheiras por um dia, que conta com o apoio do .PT, promove, junto das estudantes de ensino não superior, a opção pelas engenharias e pelas tecnologias, desconstruindo a ideia de que estas são domínios masculinos.

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