
D. Américo Aguiar é nomeado hoje cardeal pelo Papa: consistório no Vaticano é o novo do pontificado de Francisco
O consistório para a criação de novos cardeais, incluindo o futuro bispo de Setúbal, Américo Aguiar, vai decorrer este sábado, sendo já o nono do pontificado de Francisco, que já nomeou outros três portugueses como cardeais.
O primeiro consistório presidido por Francisco, eleito em março de 2013, ocorreu em fevereiro de 2014, seguindo-se outro, um ano depois, no qual foi elevado a cardeal o então patriarca de Lisboa, Manuel Clemente.
Natural de Torres Vedras, Manuel Clemente, 75 anos, é doutorado em Teologia Histórica, foi bispo do Porto e depois patriarca de Lisboa (agora emérito). Em 2009, conquistou o Prémio Pessoa.
Novos consistórios realizaram-se em 2016, 2017 e 2018.
Foi em junho de 2018 que António Marto, à data bispo da Diocese de Leiria-Fátima, se tornou conselheiro do Papa.
Membro do Dicastério para a Causa dos Santos, António Marto, natural de Chaves, tem 76 anos. Foi aluno do Papa Bento XVI (1927-2022), que acolheu em 2010 no Santuário de Fátima, onde também recebeu Francisco, em 2017.
Fez o doutoramento em Teologia em Roma, foi bispo auxiliar de Braga e passou por Viseu antes de entrar na Diocese de Leiria-Fátima, em junho de 2006, onde agora é bispo emérito.
Em outubro de 2019, foi realizado outro consistório público para a criação de novos cardeais, tendo sido nomeado Tolentino Mendonça, à data arquivista e bibliotecário do Vaticano e agora prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação.
Tolentino Mendonça, natural da Madeira, tem 57 anos. É doutorado em Teologia Bíblica, antigo vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa e um nome considerado essencial da poesia portuguesa contemporânea.
Francisco presidiu a mais dois consistórios (novembro de 2020 e agosto de 2022) antes do do próximo sábado, no qual vão ser criados 21 cardeais, 18 dos quais eleitores de um futuro Papa.
Quando anunciou este consistório, em 9 de julho, o Papa, citado pela Vatican News, salientou que a proveniência dos novos cardeais “exprime a universalidade da Igreja, que continua a anunciar o amor misericordioso de Deus a todos os homens da terra”.
África do Sul, Argentina, Colômbia, Estados Unidos da América, França, Hong Kong, Malásia, Tanzânia ou Sudão do Sul são algumas das origens dos futuros cardeais.
Américo Aguiar, presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 e coordenador geral da organização da visita, em agosto último, do Papa Francisco a Portugal, é natural de Leça do Balio, Matosinhos.
Com 49 anos, o novo bispo da Diocese de Setúbal é licenciado em Teologia e mestre em Ciências da Comunicação.
Ordenado sacerdote em 2001 e integrado na Diocese do Porto, nesta desempenhou vários cargos, como pároco ou vigário-geral. Foi também diretor do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais da Conferência Episcopal Portuguesa e presidente da Irmandade dos Clérigos, antes de ingressar na Diocese de Lisboa, onde foi, até agira, bispo auxiliar.
Com a criação de Américo Aguiar como cardeal, Portugal passa a ter quatro cardeais eleitores, incluindo Manuel Clemente, António Marto e Tolentino Mendonça.
Os cardeais Saraiva Martins e Monteiro de Castro, por terem ultrapassado os 80 anos, também integram o Colégio Cardinalício, mas não participam num futuro conclave.
Saraiva Martins, de 91 anos, é natural da Guarda. Em 1988, foi nomeado secretário da Congregação para a Educação Católica e, 10 anos depois, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Foi criado cardeal por João Paulo II (1920-2005).
Monteiro de Castro, de 85 anos, é natural de Guimarães. Foi penitenciário-mor da Santa Sé e somou uma vasta experiência diplomática ao serviço do Vaticano. Foi elevado a cardeal por Bento XVI.
A celebração deste sábado, presidida pelo Papa Francisco, começa às 10 horas (menos uma hora em Lisboa), na praça de São Pedro, no Vaticano, seguindo-se as sessões de cumprimentos dos novos cardeais.
À tarde, às 16:30, na Igreja de Santo António dos Portugueses, em Roma, Américo Aguiar celebra missa.
Já no dia 4 de outubro, às 09:00, festa litúrgica de São Francisco de Assis (o Papa escolheu o nome de Francisco para o pontificado inspirado neste santo), o líder da Igreja Católica preside, na Praça São Pedro, à missa com o Colégio Cardinalício, na abertura da Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos.
Cardeais eleitores portugueses distinguem-se em várias áreas
Os quatro cardeais portugueses que poderão eleger o Papa num futuro conclave, e também podem ser eleitos, têm-se destacado em várias áreas, como a história, a teologia ou a cultura.
“São todos muito diferentes entre si”, começa por dizer à agência Lusa o padre Paulo Terroso, diretor de Comunicação da Arquidiocese de Braga e membro da Comissão de Comunicação do Sínodo, a propósito do consistório de sábado, no qual vai ser criado cardeal Américo Aguiar, futuro bispo da Diocese de Setúbal.
Américo Aguiar juntar-se-á a Manuel Clemente (patriarca emérito de Lisboa), António Marto (bispo emérito da Diocese de Leiria-Fátima) e Tolentino Mendonça (prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação) como cardeais eleitores.
Segundo Paulo Terroso, Manuel Clemente “é um homem que interpreta a Igreja e a sociedade portuguesa numa perspetiva histórica”.
“É uma personalidade reconhecida pela Igreja em Portugal e pela sociedade portuguesa pelas suas intervenções assertivas, capacidade de diálogo e tolerância”, afirmou o sacerdote, realçando que o agora patriarca emérito é, também, “um homem de oração”.
Já em António Marto, Paulo Terroso reconheceu “um teólogo ao bom estilo dos padres da Igreja”, capaz de “tornar acessível a todos os conteúdos mais complexos da fé”, além de um “homem humana e espiritualmente muito sensível”.
De Tolentino Mendonça destacou as suas facetas de escritor, poeta e ensaísta, para o descrever como “um homem com um sentido raro para ler ‘os sinais dos tempos’”.
“Talvez, por isso mesmo, consegue, como poucos em Igreja, compreender o mundo contemporâneo e dialogar com ele, iluminando-o com a luz do Evangelho”, adiantou.
Sobre Américo Aguiar, presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023, Paulo Terroso apontou-lhe a qualidade de “hábil pragmático”.
“Um ‘fazedor’, com tudo o que isso implica. De verbo fácil e com uma grande capacidade comunicativa”, sustentou o padre Paulo Terroso.
A professora catedrática Teresa Toldy acrescentou que será interessante ver qual a dinâmica que Américo Aguiar “consegue imprimir à Diocese de Setúbal”, que teve uma “figura extraordinariamente marcante”, o bispo Manuel Martins (1927-2017).
“Espero, sinceramente, que o bispo que vai para Setúbal mantenha essa atitude (…), sobretudo a preocupação da justiça e da proximidade com os mais pobres”, declarou Teresa Toldy.
Assinalando a dinâmica que Américo Aguiar imprimiu à JMJ, a docente da Universidade Fernando Pessoa notou que o futuro conselheiro do Papa “parece ser uma pessoa com muita iniciativa e isso para a Diocese de Setúbal é importante”.
Quanto a Tolentino Mendonça, Teresa Toldy observou a “capacidade que tem de interlocução com o mundo, com o mundo intelectual em Portugal que lhe reconhece autoridade derivada não do facto de ser cardeal, mas da qualidade que ele tem nas obras que produz”.
A professora catedrática, que foi aluna de Manuel Clemente, disse, por seu turno, que o patriarca emérito é uma “pessoa extremamente culta” que “veio da área da História”, recordando a sua “vocação tardia” (entrou no seminário aos 24 anos).
Sublinhando que António Marto é “também um incondicional do Papa Francisco e isso é muito importante”, Teresa Toldy alegou, sobre estes dois prelados eméritos, que “a sabedoria das pessoas que são mais idosas é muito importante na Igreja, mas também é importante que essas vozes compreendam, oiçam com muita atenção as vozes daqueles que são mais jovens”.
O padre jesuíta Nuno da Silva Gonçalves, professor na Pontifícia Universidade Gregoriana, considerou, igualmente, que os cardeais “são pessoas muito diferentes e cada uma está presente, a seu modo, na Igreja portuguesa”, sendo que em Manuel Clemente e António Marto se encontra “o testemunho da experiência pastoral e da profundidade intelectual”.
No caso de Manuel Clemente, “olha para a realidade portuguesa com a sabedoria de um historiador, habituado a olhar para o país na atenção às suas raízes mais profundas”, notou, referindo que, “a essa sabedoria humanística, junta uma grande experiência pastoral como bispo diocesano no Porto e em Lisboa”.
“Penso que a Igreja portuguesa ainda poderá aprender muito da sua sabedoria, da sua proximidade às pessoas e do seu equilíbrio”, declarou Nuno da Silva Gonçalves.
Em António Marto, o sacerdote vê a “profundidade intelectual do teólogo, atento aos sinais dos tempos”, cuja “profundidade académica foi enriquecida pelo trabalho pastoral” nas dioceses de Braga, Viseu e Leiria-Fátima.
“Agora, como emérito, penso que o seu testemunho de abertura e o modo como nos ajuda a olhar para o futuro com confiança e coragem ainda poderão ser muito úteis à Igreja portuguesa”, defendeu.
Quanto aos cardeais Tolentino Mendonça e Américo Aguiar, dos mais jovens do Colégio Cardinalício, o jesuíta assinalou que o primeiro, “académico, poeta e ensaísta reconhecido e premiado”, tem “uma enorme capacidade de estabelecer pontes com realidades afastadas da Igreja, em particular no campo cultural e artístico”.
“Tem, por isso, o mérito de levar o Evangelho a todos, mesmo onde as portas parecem mais fechadas. Essas suas grandes capacidades de diálogo, de delicadeza e de proximidade estão, agora, ao serviço da Igreja universal, como prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação”, sublinhou Nuno da Silva Gonçalves.
Sobre Américo Aguiar, “demonstrou grandes capacidades de organização e de comunicação nas muitas missões que recebeu, quer no Porto, quer em Lisboa”, capacidades que, nos últimos anos, estiveram “bem patentes” na organização da JMJ, a que o Papa presidiu, “e a Igreja muito lhe fica a dever pelas qualidades que demonstrou”.
“Ao criá-lo cardeal, o Papa Francisco reconhece e premeia essas qualidades”, disse o sacerdote, defendendo que a nomeação como bispo de Setúbal “confirma que admira as suas qualidades de ação e de decisão e que o vê como um pastor dedicado e corajoso”.