Cuidado com os riscos: é seguro cozinhar com um tacho de ferro fundido esmaltado com danos?

Para muitos cozinheiros domésticos, investir num tacho de ferro fundido esmaltado de alta qualidade — como os da Le Creuset ou Staub — é uma decisão séria e dispendiosa, justificada pela durabilidade do utensílio, que se espera durar uma vida inteira. Contudo, o aparecimento de riscos ou lascas no esmalte pode gerar preocupação legítima: estará o tacho ainda seguro para uso?

A HuffPost procurou respostas junto de especialistas em segurança alimentar e chefs profissionais, e as conclusões apontam para uma verdade importante: nem todos os riscos são iguais, mas alguns podem, de facto, tornar o uso do utensílio perigoso.

O esmalte que reveste este tipo de tachos é, essencialmente, vidro fundido. Segundo Bryan Quoc Le, cientista alimentar e consultor da Mendocino Food Consulting, “o ferro fundido esmaltado que apresenta lascas pode representar um perigo físico, porque o revestimento de esmalte é, na prática, vidro fundido ao ferro”. Se esse revestimento se soltar e cair na comida, o consumidor pode acabar por ingerir fragmentos cortantes, com risco de laceração na boca, garganta, esófago, estômago ou intestinos.

Além disso, Melissa Vaccaro, especialista em segurança alimentar da National Environmental Health Association (NEHA), alerta que “se o esmalte estiver lascado ou rachado e expuser o ferro fundido subjacente, os alimentos podem entrar em contacto com o metal, levando à oxidação e libertação de metais”. A ferrugem, composta por óxido de ferro, não é considerada segura para consumo pela USDA (autoridade norte-americana para a segurança alimentar).

E o risco de metais pesados?
Se o tacho for uma herança familiar ou uma versão vintage, há ainda outro perigo. Vaccaro sublinha que “alguns esmaltes antigos ou de baixa qualidade podem conter chumbo ou cádmio, substâncias perigosas que já não são usadas por marcas reputadas como a Le Creuset ou Staub”. Caso esses elementos se soltem com o esmalte, há risco de ingestão de metais pesados, com possíveis consequências como hipertensão, problemas renais, irritação gástrica, complicações cardiovasculares e riscos durante a gravidez.

Riscos superficiais não são motivo de alarme imediato
Nem todos os danos implicam abandonar o utensílio. Riscos ligeiros ou marcas superficiais — desde que não exponham o ferro fundido — são considerados inofensivos.

“Riscos superficiais no esmalte, que não revelem o metal por baixo, são geralmente apenas estéticos e não representam perigo para a saúde”, garante Vaccaro. Acrescenta ainda que “estes riscos aparecem naturalmente com o tempo e são seguros para cozinhar”.

Ainda assim, é importante vigiar a evolução desses riscos. Quando se começam a sentir arestas, notar o metal nu ou ver o esmalte a descamar, a situação pode tornar-se perigosa, especialmente se ocorrer em zonas que entram em contacto direto com os alimentos.

Infelizmente, uma vez que o esmalte está danificado de forma significativa, não é possível recuperá-lo em casa — nem mesmo através de reparações profissionais convencionais.

Chris Van Dyne, chef executivo da Cosmic Pie Pizza (Santa Fé, Novo México), explica que “não é possível reaplicar o esmalte em casa. Estes esmaltes são cozidos a temperaturas superiores a 760 °C num forno industrial, o que exige equipamento especializado”.

E mesmo que se pense em recorrer a um serviço de cerâmica, a esperança é vã. Bryan Quoc Le reforça: “O esmalte é aplicado durante a produção através de um processo específico e contínuo, sem previsão de reaplicação. Mesmo lixar ou suavizar as lascas pode enfraquecer ainda mais a estrutura e acelerar a degradação.”

Enquanto uma frigideira de ferro fundido tradicional pode ser raspada e retemperada com óleo, “o esmalte não pode ser retemperado nem remendado”, sublinha Vaccaro.

No entanto, nem tudo está perdido. Se o tacho lascado for de uma marca premium como Le Creuset ou Staub, Van Dyne recomenda verificar a garantia: “Muitas vezes, estas marcas substituem unidades lascadas gratuitamente ou com desconto, mesmo após vários anos”.

Para quem não puder recorrer à garantia, há alternativas criativas para reutilizar os tachos danificados. Utilizadores do YouTube, TikTok e Pinterest têm transformado os seus antigos Dutch ovens em vasos para plantas, recipientes de armazenamento, baldes de gelo, banheiras para pássaros, humidificadores e muito mais. Com alguma imaginação e pesquisa, é possível dar uma nova utilidade a estas peças.

Como prolongar a vida útil do seu tacho esmaltado
Para evitar que o seu precioso tacho atinja este ponto de degradação, a chef Melissa Araujo, proprietária do Alma Café em Nova Orleães, deixa alguns conselhos práticos:

  • Evite choques térmicos: “Certifique-se de que o tacho está frio antes de o lavar.”
  • Use esponjas suaves: “Nunca utilize esponjas abrasivas. Elas podem riscar o esmalte.”
  • Não deixe de molho: “Evite deixá-lo de molho no lava-loiça por longos períodos — isso permite que a água penetre sob o revestimento e provoque ferrugem nas bordas.”
  • Seque bem: “Seque completamente após a lavagem para prevenir a ferrugem.”
  • Para manchas teimosas: Araujo sugere “misturar bicarbonato de sódio com água, aplicar na mancha durante 10 minutos, depois enxaguar e lavar com uma esponja suave e detergente suave”. Se necessário, repetir o processo.
  • Nada de máquina de lavar loiça: “Mesmo que o fabricante diga que é ‘apto para máquina’, evite. A pressão da água e o calor elevado podem danificar o revestimento.”
  • Armazenamento cuidadoso: “Guarde o tacho com uma toalha no interior para o proteger e mantenha a tampa ligeiramente deslocada para permitir circulação de ar.”