CNE apresenta queixa contra o Governo Regional da Madeira ao Ministério Público por violação de neutralidade eleitoral

A Comissão Nacional de Eleições (CNE) apresentou uma queixa contra o Governo Regional da Madeira ao Ministério Público (MP), na sequência da publicação de mensagens nas redes sociais consideradas elogiosas e propagandísticas em pleno período pré-eleitoral. A entidade reguladora determinou a remoção das publicidades institucionais em causa, mas o executivo madeirense recorreu ao Tribunal Constitucional (TC), que manteve a condenação, considerando que as publicações violaram os limites legais de neutralidade e imparcialidade.

Num acórdão proferido a 6 de março, citado pelo Público, o TC concluiu que o Governo Regional da Madeira utilizou as suas plataformas institucionais para divulgar conteúdos que exaltem a sua própria gestão, algo expressamente proibido no período que antecede as eleições. “Fizeram o que a lei proíbe. A publicidade de ações governativas que promoveram, envolta numa lógica de elogio e exaltação das realizações dos atuais responsáveis políticos, não respeita os limites” legais, sublinha o documento.

A lei apenas permite publicidade institucional pelos órgãos do Estado e da Administração Pública em períodos eleitorais quando se verifique “grave e urgente necessidade pública”, o que, no entender da CNE e do TC, não se aplica neste caso. O acórdão frisa ainda que os dirigentes regionais “utilizaram a sua posição funcional, que lhes assegura acesso exclusivo às páginas oficiais de comunicação do Governo Regional e da Secretaria Regional das Finanças da Madeira, de uma maneira passível de granjear um ganho reputacional para uma determinada candidatura, inalcançável para os seus concorrentes, criando um desequilíbrio inaceitável na disputa democrática”.

Publicações visadas pela CNE
Entre as publicações identificadas como problemáticas pela CNE, encontra-se uma em que se destaca que “Só a continuidade de uma política financeira séria, consistente e responsável permite que tenhamos mais educação, melhor saúde, melhor assistência social, melhor qualidade de vida e mais futuro”. Outras mensagens referem, por exemplo, a inauguração do parque urbano do Porto Santo em 2023, classificado como “uma infra-estrutura multifacetada para usufruto da população e de turistas”, e ainda apoios concedidos a jovens agricultores no valor de 5,7 milhões de euros.

Na sua deliberação, a CNE destaca ainda a presença constante da imagem do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, nas publicações, além do tom elogioso à actuação do executivo. Outra expressão mencionada pela comissão como problemática refere-se a críticas a outras forças políticas, nomeadamente a frase: “Alguém anda a brincar aos partidos e a deitar governos abaixo”, vista como uma tentativa de denegrir adversários do PSD.

Por considerar existirem indícios de violação dos deveres de neutralidade e imparcialidade, a CNE decidiu encaminhar o caso para o Ministério Público. De acordo com a lei eleitoral para a Assembleia Legislativa da Madeira, esta infracção pode ser punida com pena de prisão até um ano e multa entre 500 e 2000 euros. Além disso, partidos lesados podem constituir-se assistentes num eventual inquérito-crime.

O governo regional tentou argumentar que o período de campanha eleitoral só começou formalmente no passado domingo e que as publicações eram factuais e não propagandísticas. No entanto, este argumento não foi aceite pelo Tribunal Constitucional.

Caso não apague as publicações, o executivo regional poderá incorrer no crime de desobediência. A CNE advertiu ainda os governantes para que se abstenham, até ao final do processo eleitoral, de realizar quaisquer declarações ou ações que favoreçam ou prejudiquem candidaturas.

Albuquerque desvaloriza acusações
O presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, que se recandidata nas eleições antecipadas marcadas para 23 de março, desvalorizou a situação. No início do mês, em declarações à RTP Madeira, Albuquerque considerou ridículo o número de queixas apresentadas contra ele: “Tenho uma ou duas queixas por dia [contra mim] na Comissão Nacional de Eleições, é ridículo. Mas não posso fazer nada, não vou deixar de aparecer”.