
Cientistas identificam novo fator que agrava fenómenos extremos: ondas atmosféricas amplificadas associadas às alterações climáticas
Um novo estudo publicado esta segunda-feira na prestigiada revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) revelou que as alterações climáticas estão a triplicar a frequência de eventos atmosféricos associados a ondas planetárias, fenómeno que tem estado na origem de fenómenos meteorológicos extremos como vagas de calor letais, secas prolongadas e cheias devastadoras. A investigação ajuda a explicar por que motivo as previsões dos modelos climáticos têm subestimado o aumento destes eventos ao longo das últimas décadas.
De acordo com o estudo, elaborado por uma equipa de cientistas liderada pelo climatologista Michael Mann, da Universidade da Pensilvânia, o número de eventos extremos induzidos por ondas planetárias quase triplicou nos últimos 75 anos. Nos anos 50 do século passado, a Terra registava, em média, um destes eventos durante o verão. Hoje, o número subiu para três por verão.
As ondas planetárias — grandes ondulações na circulação atmosférica que influenciam o comportamento do jato polar — estiveram ligadas a episódios meteorológicos dramáticos das últimas décadas. Entre eles contam-se a vaga de calor sem precedentes no Noroeste do Pacífico em 2021, a vaga de calor na Rússia e as cheias no Paquistão em 2010, bem como a vaga de calor europeia de 2003, que causou milhares de mortes.
“Se tentarmos visualizar estas ondas no hemisfério norte, o mais simples é olhar para o mapa meteorológico e observar as ondulações no jato polar”, explicou Michael Mann à Associated Press. O fenómeno, designado amplificação quase ressonante (QRA, na sigla inglesa), faz com que estas ondas fiquem “presas” durante semanas, bloqueando sistemas de alta ou baixa pressão sobre determinadas regiões.
Quando estas ondas ficam estacionárias, o resultado são padrões meteorológicos extremos e duradouros. “Um padrão clássico seria um anticiclone no oeste dos Estados Unidos e uma depressão no leste. Foi exatamente o que aconteceu no verão de 2018. Durante cerca de um mês, o oeste foi fustigado pelo calor, pela seca e pelos incêndios, enquanto o leste enfrentou chuvas excessivas”, exemplificou Mann.
Este bloqueio atmosférico leva a que algumas regiões enfrentem precipitação incessante durante dias, enquanto outras ficam submetidas a temperaturas sufocantes sem alívio. “É profundo e persistente. A chuva acumula-se durante dias ou o solo fica ressequido ao longo de longos períodos”, sublinhou o cientista.
O estudo aponta como causa principal destas alterações o aquecimento global induzido pelo homem, nomeadamente devido à queima de combustíveis fósseis. A explicação reside no facto de o Ártico estar a aquecer três a quatro vezes mais depressa do que o resto do planeta, reduzindo assim o contraste de temperaturas entre os trópicos e o Ártico — um factor que enfraquece o jato polar e torna as ondas planetárias mais propensas a ficar bloqueadas.
“Este estudo lança luz sobre mais uma forma pela qual as atividades humanas estão a perturbar o sistema climático, com consequências que nos vão atingir a todos, na forma de eventos meteorológicos de verão cada vez mais destrutivos e sem precedentes”, alertou Jennifer Francis, cientista do Woodwell Climate Research Center, que não participou na investigação. Para Francis, além do aquecimento geral e do aumento da evaporação, estas flutuações no jato polar contribuem para manter os sistemas meteorológicos imóveis, favorecendo episódios prolongados de calor, seca e precipitação intensa.
El Niño e o futuro próximo
O estudo refere ainda que os episódios de El Niño — aquecimento natural das águas do Pacífico central que altera os padrões meteorológicos globais — contribuem para a formação destas ondas amplificadas. Mann recorda que o verão de 2024 foi marcado por um El Niño, o que poderá tornar o verão de 2025 particularmente vulnerável ao bloqueio do jato polar e às suas consequências.
Tanto Mann como Francis alertam que os modelos climáticos atuais subestimam o impacto deste mecanismo. “Os modelos não estão a captar este mecanismo vital, o que explica porque é que os extremos têm aumentado mais do que prevíamos”, explicou Mann. A cientista Jennifer Francis reforça: “Se continuarmos a emitir gases com efeito de estufa, os fatores que agravam os extremos de verão vão multiplicar-se. As vagas de calor durarão mais tempo, serão mais intensas e cobrirão maiores extensões. As secas irão destruir mais colheitas.”