
Carris com velocidade média mais baixa de sempre: autocarros e elétricos a ritmo de caracol em Lisboa (e boa parte da culpa é de veículos mal estacionados)
A velocidade média dos autocarros da Carris voltou a descer em 2024, atingindo o valor mais baixo desde que há registos. Segundo o relatório e contas da empresa municipal de transportes, aprovado esta semana pela Câmara de Lisboa, os veículos circularam a uma média de 13,71 km/h, o que representa uma queda de 1,3% face ao ano anterior. Em 2023, essa média era de 13,88 km/h. A tendência de desaceleração arrasta-se há anos e é acompanhada por outros dados preocupantes: descida no número de passageiros, aumento de acidentes e crescimento nas ocorrências de estacionamento indevido que obstruem a circulação.
No caso dos elétricos, de acordo com o relatório citado pelo jornal Público, o cenário é ainda mais negativo. A velocidade média caiu 7,4%, passando de 9,09 km/h em 2023 para 8,42 km/h em 2024. No conjunto da operação de superfície — autocarros e elétricos — a média geral caiu de 13,54 km/h para 13,31 km/h, uma redução global de 1,7%. O documento, que apenas obteve o voto favorável da coligação “Novos Tempos”, liderada por Carlos Moedas, aponta o dedo a três principais causas para o agravamento das condições de circulação: interrupções no tráfego rodoviário, estacionamento indevido e obras na via pública, com destaque para as empreitadas do Plano Geral de Drenagem de Lisboa e da expansão do Metro.
Apesar das críticas da oposição, que vê nestes números um sinal do fracasso da gestão da Carris, a administração da empresa afirma estar a colaborar ativamente com a Câmara Municipal de Lisboa para reverter esta tendência. O relatório menciona intervenções em curso, como a melhoria da semaforização e dos corredores BUS, com vista a aumentar a fiabilidade e a regularidade do serviço. Foram também reforçadas as sinalizações horizontais, através das chamadas Brigadas LX, numa parceria entre a autarquia e a Carris.
Contudo, estas promessas não são novas. As mesmas medidas já tinham sido referidas no relatório de 2023, sem que se tenham verificado melhorias no desempenho. Em dois anos, a Carris perdeu 3,4% da sua velocidade média. A empresa continua a justificar o agravamento da situação com a deterioração das condições de circulação viária. O estacionamento indevido destaca-se como um dos principais entraves: em 2024, registaram-se 1.365 ocorrências, mais 13,8% do que no ano anterior. O número de horas em que os veículos estiveram parados por esta razão subiu 21,2%, de 811 horas em 2023 para 983 horas no ano passado.
Os efeitos acumulados são evidentes. O número de veículos imobilizados por estacionamento irregular subiu de 1.378 em 2023 para 1.620 em 2024, e os arruamentos afetados aumentaram de 198 para 207. Para combater este fenómeno, foi criado, em setembro de 2024, um serviço conjunto entre a Carris e a Polícia Municipal, com ações diárias de fiscalização nos corredores BUS.
A qualidade do serviço também se ressentiu no que diz respeito à sinistralidade. Em 2024, registaram-se 1.672 acidentes, mais 6,9% do que os 1.564 de 2023. Embora os elétricos tenham registado uma ligeira melhoria, os autocarros estiveram envolvidos em 1.519 acidentes, uma subida de 9,8%. A Carris nota que o indicador inclui também “pequenos abalroamentos ou quedas de passageiros”, o que poderá relativizar a gravidade dos números.
Por fim, estes problemas refletem-se diretamente na procura. A taxa de ocupação — que relaciona passageiros por quilómetro com lugares por quilómetro — desceu 0,4% em 2024. Apesar das promessas de requalificação do serviço e das medidas anunciadas, a realidade dos números mostra um sistema de transporte cada vez mais lento, menos eficiente e com menor atratividade para os utentes, num contexto em que se pretende precisamente o contrário: transferir o peso da mobilidade urbana do automóvel para o transporte público.