Carris com desvios e supressões nas linhas noturnas. Condutores com receio de passarem em algumas zonas

O recente clima de insegurança nas linhas noturnas da Carris Metropolitana, que servem os arredores de Lisboa, tem levado a várias alterações nos percursos e horários dos autocarros, com algumas linhas a serem parcialmente suprimidas. A decisão surge após uma série de incidentes violentos e apedrejamentos de viaturas, sobretudo após a morte de Odair Moniz, morador do Bairro do Zambujal, na Amadora, vítima de disparos feitos pela polícia. Este episódio intensificou as tensões nos bairros da Grande Lisboa, em particular na Cova da Moura, onde motoristas têm manifestado receio em circular, principalmente em horários noturnos.

Vários condutores recusam-se a entrar em determinadas áreas, temendo pela sua segurança devido ao aumento de atos violentos, incluindo o lançamento de cocktails-molotov em autocarros e o apedrejamento frequente de viaturas. Num dos casos mais graves, em Santo António dos Cavaleiros, Loures, um motorista ficou gravemente ferido, o que agravou a perceção de insegurança entre os profissionais da Carris Metropolitana. “Os ataques a motoristas de transportes públicos, especialmente em certas zonas da área metropolitana, não são novidade”, apontam fontes do setor ao PÚBLICO, sublinhando que os recentes incidentes vieram aumentar o receio.

A situação está a causar impacto na mobilidade de muitos trabalhadores de serviços essenciais e estudantes que dependem destes percursos noturnos para as suas deslocações. “Apesar de uma redução nos episódios de vandalismo nos últimos dias, ainda se verificam apedrejamentos, como o de segunda-feira à noite em Arrentela, Seixal”, relatam fontes da Carris Metropolitana.

A cobertura mediática dos incidentes está também a ser questionada pelo Sindicato Nacional de Motoristas e outros Trabalhadores (SNMOT). “Esta exposição mediática, especialmente nas televisões, está a dar visibilidade aos prevaricadores”, afirmou Manuel Oliveira, vice-presidente do sindicato. Segundo Oliveira, “é precisamente esse efeito espetacular que os grupos de vândalos procuram”, apelando a uma maior contenção por parte dos meios de comunicação.

Devido à escalada de insegurança, a Transportes Metropolitanos de Lisboa (TML), entidade que gere a frota de cerca de 1600 viaturas da Carris Metropolitana, intensificou a monitorização em tempo real dos incidentes, em colaboração com a Polícia de Segurança Pública (PSP). Foi criado um canal de comunicação direto, através do WhatsApp, entre os profissionais de transportes públicos da Área Metropolitana de Lisboa e o Comando Metropolitano de Lisboa da PSP. Este canal envolve motoristas da Carris Metropolitana, da Carris (Lisboa), da CP, do Metropolitano de Lisboa, da Fertagus, da Transtejo-Soflusa e dos serviços de autocarros de Cascais e do Barreiro.

Este sistema permite uma partilha imediata de incidentes e situações suspeitas para uma intervenção rápida das autoridades, garantindo uma resposta coordenada e atempada, essencial face ao crescente número de ameaças à segurança dos motoristas.

A Carris Metropolitana, optando por não comentar publicamente a situação, tem adotado uma política de análise e gestão individualizada dos percursos. De acordo com uma fonte da empresa, cada caso é avaliado “com malha apertada”, considerando o receio expresso pelos motoristas. “Não forçamos ninguém a trabalhar se houver um desconforto ou sentimento de insegurança”, sublinhou a mesma fonte, esclarecendo que a gestão de cada situação é feita em colaboração com as chefias diretas.

A intenção é, assim que possível, retomar a normalidade operacional, equilibrando a necessidade de segurança dos motoristas com a continuidade dos serviços para os utentes. A PSP também tem intervindo, recomendando que certas áreas sejam evitadas nos primeiros dias após os incidentes, incluindo a suspensão temporária da circulação em locais mais críticos.

Na semana passada, a Carris, empresa controlada pela Câmara Municipal de Lisboa, anunciou “desvios pontuais em alguns troços do trajeto” nas carreiras 714 e 754, como resposta aos incidentes. A carreira 714 termina no bairro da Outurela, em Oeiras, enquanto a 754 passa pelo bairro do Zambujal, onde dois autocarros da Carris Metropolitana foram recentemente incendiados. Segundo Manuel Oliveira, do SNMOT, estas alterações têm impactos severos para os utentes. “Infelizmente, são as pessoas que dependem destes serviços que acabam por ser prejudicadas com a suspensão das carreiras. Paga o justo pelo pecador”, lamenta.

A situação de insegurança nas linhas noturnas da Carris Metropolitana é, segundo os sindicatos, um problema recorrente que exige uma resposta efetiva das autoridades. “A violência contra os motoristas, seja verbal ou física, é algo que enfrentamos regularmente em certos bairros”, explica Oliveira. Contudo, alerta que a recente destruição de autocarros representa uma nova dimensão do problema, destacando a urgência de medidas mais eficazes para proteger os profissionais e garantir a continuidade do serviço público essencial que os motoristas prestam.

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