Aumento dos combustíveis deixa setor dos transportes em sobressalto: associações em dificuldades exigem resposta do Governo para evitar contestação nas ruas
O aumento do preço dos combustíveis tem afetado não só o bolso dos condutores nacionais particulares mas também todo um setor de atividade – os transportes – que viram os custos disparar em flecha, o que naturalmente coloca muitos desafios e dificuldades para manter as empresas a funcionar. Para medir o impacto, três associações representativas do setor dos transportes – Associação Nacional Movimento TVDE, o sindicato SITRA (Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes) e a ANTRAL (Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros) – revelaram em exclusivo à ‘Executive Digest’ os principais desafios vividos e com um apelo em comum: “O Governo tem de fazer mais.”
Vítor Soares, presidente da mesa da Assembleia Geral da Associação Nacional Movimento TVDE, destacou as fortes dificuldades vividas no setor, a ponto de já ter perdido a conta às empresas que se viram forçadas a fechar as portas.
“Temos estado a receber queixas dos associados e motoristas TVDE ao qual está insuportável o aumento dos combustíveis, está a colocar em risco a sustentabilidade do setor. As plataformas não estão a fazer as atualizações devidas pelo aumentos dos combustíveis e das matérias-primas. Até as peças dos automóveis encarecem sucessivamente, o que coloca em causa a sustentabilidade de muitas firmas, que poderão vir a fechar”, relatou.
“Muitas empresas estão à tona e com muitas dificuldades de sobrevivência e sustentabilidade. Já se nota o aumento da cedência e venda das empresas na internet. As pessoas já se querem ver livres das responsabilidades das empresas, já não estão a faturar para os custos. Os empresários que investiram no setor não conseguem ver rentabilizado o investimento”, indicou Vítor Soares, que garantiu que “os sócios estão a fazer-nos chegar muita informação de que não está a ser rentável, das muitas dificuldades da faturação e custos da empresa. Não é aceitável um motorista estar a ganhar 5 euros à hora. Se se faz 12, 14 ou 16 horas de trabalho: o combustível ‘queima’ 40% da rentabilidade do negócio. Isto já está a colocar em risco a dinâmica e segurança de todos”.
É possível haver contestação na rua? “Sim. A associação está a preparar-se, junto dos associados, para fazer contestação pública, nas ruas, caso o Governo não aja em conformidade. A data ainda não está decidida mas será para breve. É insuportável a subida dos combustíveis face aos custos das viagens”, prometeu.
Do lado dos trabalhadores, o aumento dos combustíveis afeta mais a nível particular do que a nível profissional, relatou Rui Caleiras, secretário-geral do SITRA – Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes, que garantiu que a responsabilidade está do lado das empresas e não dos trabalhadores. “Isso é um problema que todas as empresas de transporte terão de tentar tentar resolver com o Governo em termos de apoio.”
No entanto, o aumento dos custos afeta todo o setor, de forma transversal, trabalhadores incluídos. Mas o SITRA garantiu estar tranquilo. “Infelizmente, o setor dos transportes rodoviários já tem, até 2026, fixado os aumentos, ou seja, o valor do salário mínimo ou a percentagem que for aplicada, conforme seja o maior. Não vai alterar até 2026, independentemente dos custos dos combustíveis, que serão certamente um problema para as empresas, mas não vai alterar a negociação coletiva. Está estabelecido um acordo para 4 anos no setor privado. Já no setor público, pode haver alguns problemas por isso”, reconheceu, frisando que os trabalhadores “não estão preocupados” com o valor dos combustíveis para as empresas, somente com esse valor “nos próprios bolsos”.
Já Florêncio Almeida, responsável da ANTRAL – Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros -, referiu que o “aumento dos combustíveis afeta não só os setores de atividade como toda a população”. “Se aumentam os combustíveis, tem de aumentar todo o nível de vida.”
“No nosso setor, estamos em negociações com o sistema de tarifário que vem em consequência deste aumento do preço do gasóleo, que será contemplado nesta proposta, de certeza, e por conseguinte estamos à espera de uma reposta do Governo. Caso contrário, o setor não pode continuar a viver como tem vivido até aqui”, referiu o presidente da associação. “Os custos dos combustíveis representam entre 25 e 30% no nosso setor. Aumentou, nos últimos 2 meses, cerca de 28 cêntimos e tornou os custos horríveis. Não são precisos estudos económicos para se provar que isto não pode continuar assim”, precisou.
As dificuldades no setor são visíveis mas o Governo teima em não dar resposta: “As negociações já existem há quatro meses. Em julho ficaram de dar uma resposta e ainda recentemente voltei a alertar o secretário de Estado para as negociações uma vez que está a ficar insuportável e para tomarem uma decisão o mais rapidamente possível”.
Há, no entender de Florêncio Almeida, algo que o Governo pode fazer: “Desincentivar o consumo de combustível e acabar com o IVA no gasóleo, que era uma grande ajuda ao setor, pelo menos enquanto a situação não normalizasse”, frisou o responsável, garantindo que “se não houver resposta do Governo, naturalmente a indústria vai tomar uma posição”.