Atenção ao usar estas três especiarias muito comuns! Há risco de interferirem com medicamentos, alerta especialista

Uma pitada de canela no arroz doce, um pouco de curcuma no caril ou um toque de gengibre nos biscoitos: estas três especiarias são comuns em cozinhas por todo o mundo, apreciadas não só pelo sabor como também pelas suas supostas propriedades medicinais. Mas será que podem interferir com a eficácia de medicamentos? A resposta é sim — especialmente quando consumidas em grandes doses ou sob a forma de suplementos.

De acordo com a especialista em Farmácia Prática, Dipa Kamdar, da Kingston University, em conselhos dados ao The Conversation, embora estas especiarias tenham sido tradicionalmente valorizadas na medicina ayurvédica e chinesa pelas suas propriedades terapêuticas, há evidências de que, em determinadas circunstâncias, podem comprometer tratamentos farmacológicos.

Canela: benefícios conhecidos, riscos escondidos
A canela, extraída da casca das árvores do género Cinnamomum, é rica em compostos ativos como cinamaldeído, eugenol e cumarina. Em pequenas quantidades, oferece antioxidantes, propriedades anti-inflamatórias e benefícios na regulação da glicemia e da função cerebral. Porém, um estudo recente da Universidade do Mississippi veio levantar preocupações.

Em experiências laboratoriais, o cinamaldeído revelou-se capaz de ativar recetores que aceleram o metabolismo e a eliminação de fármacos do organismo. Esta ação pode, potencialmente, reduzir a eficácia de determinados medicamentos. Embora os resultados ainda não tenham sido testados em humanos, abrem a porta a novas investigações sobre interações entre a canela e fármacos modernos.

Importa também distinguir os tipos de canela. A mais comum nos supermercados é a canela cássia, proveniente de partes da Ásia e com níveis mais elevados de cumarina — uma substância que, em grandes quantidades, pode ser hepatotóxica e interfere com anticoagulantes como a varfarina. Já a canela do Ceilão, oriunda do Sri Lanka e geralmente mais cara, tem menores concentrações deste composto.

Segundo Kamdar, “existem alguns relatos clínicos que sugerem que suplementos de canela podem aumentar o risco de hemorragias quando tomados juntamente com anticoagulantes”. Isso acontece porque a cumarina interfere com as enzimas hepáticas responsáveis pela metabolização de fármacos como a varfarina.

Outros medicamentos que poderão sofrer interferência incluem analgésicos, antidepressivos, fármacos oncológicos e antidiabéticos. No entanto, sublinha-se que os riscos decorrem sobretudo do consumo elevado — por exemplo, através de suplementos — e não do uso moderado na culinária.

Curcuma: propriedades anti-inflamatórias com precauções
A curcuma, ou açafrão-da-índia, é valorizada tanto pela sua cor vibrante como pelas propriedades anti-inflamatórias atribuídas ao seu principal composto ativo: a curcumina. Estudos laboratoriais e em animais apontam para efeitos positivos na saúde, mas também para potenciais interações com medicamentos.

A curcumina pode interferir com enzimas hepáticas, afetando o metabolismo de antidepressivos, anti-hipertensores, antibióticos e fármacos de quimioterapia. Tal como a canela, a curcuma apresenta propriedades anticoagulantes, podendo potenciar os efeitos de medicamentos como a varfarina ou o ácido acetilsalicílico.

“Estudos em animais sugerem ainda que a curcuma pode reduzir os níveis de açúcar no sangue, o que pode amplificar os efeitos de medicamentos antidiabéticos ou da insulina”, alerta Kamdar. Esta especiaria poderá também reduzir a tensão arterial, o que, combinado com fármacos anti-hipertensores, pode levar a hipotensão.

Apesar de tudo, as evidências em humanos continuam limitadas e a maioria dos efeitos adversos está associada ao uso em doses elevadas, sobretudo através de suplementos.

Gengibre: efeitos positivos e precauções semelhantes
Utilizado há séculos contra náuseas e inflamações, o gengibre é outro ingrediente que suscita interesse científico. O composto ativo gingerol pode, tal como os anteriores, influenciar o metabolismo de medicamentos no organismo.

O gengibre atua como um anticoagulante ligeiro, e por isso, o seu consumo em excesso pode aumentar o risco de hemorragias em pessoas que tomem anticoagulantes. Quanto ao impacto na diabetes, os dados são contraditórios: há estudos que indicam que pode reduzir os níveis de glicemia, mas a investigação é ainda insuficiente para se tirarem conclusões definitivas sobre a sua interação com medicamentos antidiabéticos.

Kamdar reforça que os riscos mais significativos advêm do uso de suplementos concentrados, e não da utilização ocasional destes ingredientes na cozinha do dia-a-dia. “Se estiver a tomar medicamentos, especialmente anticoagulantes, antidiabéticos ou fármacos para o cancro, é aconselhável falar com o seu médico ou farmacêutico antes de iniciar qualquer suplemento à base de plantas.”

No entanto, para a maioria das pessoas, uma pitada de canela, um pouco de curcuma ou um toque de gengibre continua a ser uma forma saborosa e, potencialmente, benéfica de enriquecer a alimentação.