Abrir a ‘caixa da Pandora’: União Europeia avalia relacionamento com Pequim

A demonstração de solidariedade da China para com a Rússia, durante a visita de Xi Jinping a Moscovo, desagradou Bruxelas, onde crescem as preocupações de que Pequim esteja a considerar fornecer armas a Vladimir Putin. Mas para já, no seio europeu, não há um desejo real de uma separação da China.

De acordo com os alemães do ‘Deutsche Welle’, se o presidente chinês decidir “fazer amizade com um criminoso de guerra, é nosso dever levar a China muito a sério”, apontou Gabrielius Landsbergis, ministro dos Negócios Estrangeiros da Lituânia.

Dessa forma, o único caminho para a União Europeia agora é “dar os primeiros passos para reduzir os riscos e uma eventual dissociação da China. Quanto mais cedo começarmos, melhor a para UE”, apontou o responsável político.

Mas o caminho causa dúvidas em Bruxelas e há quem defenda não ser necessária uma ação tão forte – sublinharam que Xi Jinping e Putin encontraram-se mais de 40 vezes nos últimos anos, pelo que a demonstração recente de unidade já era “esperada”.

O sentimento dominante parece ser que a China está a tirar vantagem da fraqueza da Rússia. Pequim foi dos poucos que evitou chamar a invasão da Ucrânia como uma agressão da Rússia e absteve-se de todas as resoluções das Nações Unidas para condenar o Kremlin. Continua a comprar petróleo e gás russos e nos media locais abundam exemplos de repetição da propaganda do Kremlin.

A promessa do presidente Xi Jinping de uma amizade sem limites com a Rússia prejudicou ainda mais as relações da China com a UE, que já estão tensas.

Apesar dos receios de fornecimento de armas – Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, garantiu não ter qualquer evidência dessa possibilidade -, a China apoia Moscovo no seu esforço de guerra mas de forma indireta: incluem o aumento de trocas económicas e exportações de equipamentos, sustentou Grzegorz Stec, analista do escritório de Bruxelas do Instituto Mercator de Estudos da China.

Entre as exportações de equipamentos estão “pneus, caminões, roupas e outros bens que podem ser usados ​​pelos militares russos, embora não sejam especificamente armas”, disse, considerando que se o Ocidente encontrasse provas tangíveis de que a China está a fornecer equipamento militar, isso seria uma “linha vermelha” para os europeus. “Podemos estar num período de reabertura diplomática e estabilização”, reforçou, “mas a estabilização é realmente frágil e as tensões permanecem”.

“A UE não quer enfrentar mais desestabilização económica. Está interessada em manter o relacionamento estável por enquanto”, apontou. “Redefinir [o relacionamento] é como abrir uma ‘caixa de Pandora’ política.”

Essa será uma das razões pelas quais Bruxelas apresenta-se relutante em aderir às iniciativas americanas para conter a China. A administração Biden tem tentado persuadir a UE a trabalharem juntos para enfrentar Pequim. Esses esforços foram apenas parcialmente bem-sucedidos. Em março último, os Países Baixos decidiram proibir a venda de tecnologia de microchip avançada para a China e a Alemanha anunciou uma revisão de segurança em componentes críticos das suas redes de telefones móveis fornecidas pelos fabricantes chineses Huawei e ZTE.

Mas em geral, muitos países da UE hesitam em afastar-se do lucrativo mercado chinês – em primeiro lugar, a Alemanha, cujo maior parceiro comercial é a China.

Apesar dessa relutância, a atitude da Europa em relação à China é mais cética do que há décadas, revelou Reinhard Bütikofer, presidente da delegação do Parlamento Europeu na China. “Os chineses não têm tido muito sucesso em lidar com os europeus ultimamente”, disse. “Diria que desperdiçaram muito do capital político que costumavam ter.”

Com os Estados-membros em posições diferentes, não há grande entusiasmo na UE em abrir nova discussão sobre as relações com a China. “Os chineses estão a tentar equilibrar dois objetivos incompatíveis. Ser os melhores amigos de Putin e ser bons amigos dos europeus ao mesmo tempo”, disse Bütikofer.

“Como disse Abraham Lincoln, você pode enganar algumas pessoas o tempo todo ou todas as pessoas durante algum tempo. Mas você não pode enganar todas as pessoas o tempo todo”, sublinhou o especialista, referindo que, em termos políticos concretos, significaria que a China “fracassaria se insistisse na sua amizade sem limites com os russos”.

Kremlin tem países vizinhos ‘amigos’ a abastecer economia: súbito aumento das exportações da China, Arménia ou Turquia para a Rússia alerta Ocidente

Ler Mais