Não acredite em tudo o que lê nas redes sociais: ter 10 mil euros em dinheiro não é “contrabando” – saiba o que Bruxelas está realmente a preparar

Novo pacote europeu contra o branqueamento de capitais não proíbe o uso de dinheiro, mas estabelece um teto único de 10 mil euros para pagamentos em numerário a empresas, com entrada em vigor prevista para 2027

Francisco Laranjeira
Novembro 16, 2025
10:00

Tornaram-se virais nas redes sociais várias publicações onde era alegado que a União Europeia vai transformar o numerário em “contrabando” e declarar ilegal qualquer montante acima de 10 mil euros.

Mas, segundo a ‘Euronews’, essa informação é falsa: o novo pacote europeu contra o branqueamento de capitais não proíbe o uso de dinheiro, mas estabelece um teto único de 10 mil euros para pagamentos em numerário a empresas, com entrada em vigor prevista para 2027.

As publicações que circulam online afirmam que “cada euro acima de 10.000 euros passará a ser ilegal”, mas a legislação clarifica que o limite se aplica apenas às transações comerciais. Pagamentos entre duas pessoas singulares em contexto não profissional continuam excluídos destas restrições, salvo em países onde já existam limites nacionais mais apertados.

Pagamentos acima de 10 mil euros deixam de ser aceites por empresas

Com o novo regulamento, empresas em toda a União ficarão proibidas de receber pagamentos em numerário superiores a 10 mil euros. O objetivo é reduzir o risco de branqueamento de capitais, ao forçar operações de maior dimensão para meios rastreáveis, como transferência bancária ou cartão. Cada Estado-membro poderá, ainda assim, definir limites inferiores.

A viralidade das alegações levou a interpretações erradas, nomeadamente a ideia de que comprar um automóvel a dinheiro se tornará crime. De acordo com a ‘Euronews’, isso é enganador: a transação só será ilegal caso envolva uma empresa, como um concessionário, que ficará impedida de receber o montante em numerário. Entre particulares, tal pagamento continuará permitido, exceto em países com regras mais estritas, como Itália.

O regulamento não restringe a posse, levantamento ou armazenamento de numerário pelos cidadãos. Operações do dia a dia, como compras, serviços ou consumos, mantêm-se inalteradas, desmontando a tese de que a UE pretende “acabar com o dinheiro”.

Harmonização para combater branqueamento de capitais

A Comissão Europeia justificou o novo limite com a necessidade de harmonizar regras díspares dentro da UE, que atualmente vão desde a ausência de teto na Áustria até um máximo de 5 mil euros em Itália. A discrepância, argumenta Bruxelas, cria oportunidades para atividades ilícitas.

O pacote legislativo surgiu num contexto em que o branqueamento de capitais continua a ser uma prática generalizada. O Gabinete das Nações Unidas para a Droga e o Crime estimou que entre 2% e 5% do PIB mundial — até 1,87 biliões de euros por ano — seja lavado através de esquemas financeiros. Um relatório europeu de 2023 concluiu que quase 70% das redes criminosas na União utilizam numerário para ocultar rendimentos.

Segundo a Comissão, grandes quantidades de dinheiro vivo são “difíceis, se não impossíveis, de rastrear até um ato criminoso”, justificando o reforço dos mecanismos de controlo.

Entrada em vigor em 2027 e dúvidas sobre eficácia

As novas regras deverão aplicar-se a partir de julho de 2027, acompanhadas da criação de uma Autoridade Europeia de Combate ao Branqueamento de Capitais, com sede em Frankfurt. Bancos, empresas e reguladores terão três anos para adaptar sistemas e procedimentos.

Apesar do apoio generalizado, o pacote não está isento de críticas. Especialistas questionam se os limites ao numerário serão realmente eficazes ou se os criminosos migrarão para criptomoedas ou movimentações transfronteiriças. Outros alertam para o risco de aplicação desigual entre Estados-membros, o que pode comprometer o objetivo de harmonização.

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