A partir desta sexta-feira, os inquilinos que estejam abrangidos por contratos de arrendamento não comunicados às Finanças pelos senhorios passam a ter a possibilidade de o fazer eles próprios. A medida entra agora em vigor, depois de meses de preparação técnica e legislativa, e surge como uma forma de combater o arrendamento informal e garantir o acesso dos arrendatários a benefícios fiscais e apoios públicos à habitação.
Com esta mudança, os inquilinos poderão registar eletronicamente os contratos de arrendamento no Portal das Finanças, mesmo que estes já tenham terminado, desde que os senhorios não o tenham feito dentro dos prazos legais.
“O desenvolvimento e testes da aplicação estão em fase final de conclusão”, indicou o Ministério das Finanças, contactado pelo Jornal de Negócios, garantindo que está a ser feito “todo o esforço” para que o sistema esteja operacional a partir de hoje.
A Comunicação do Locatário ou Sublocatário (CLS), prevista no programa Mais Habitação, responde a uma reivindicação antiga da Associação de Inquilinos Lisbonenses (AIL) e tem como principal objetivo registar contratos que os senhorios optam por manter na informalidade, evitando o pagamento do Imposto do Selo e a emissão de recibos eletrónicos.
A nova norma consta de uma portaria publicada a 13 de março de 2025, mas só agora produz efeitos. O intervalo entre a publicação e a entrada em vigor justificou-se com o tempo necessário para desenvolver a aplicação eletrónica que permitirá este novo procedimento no Portal das Finanças.
A alteração decorre da revisão do Código do Imposto do Selo, que passou a prever que, caso o senhorio (ou sublocador) não comunique o contrato à Autoridade Tributária (AT), o inquilino (ou sublocatário) pode fazê-lo por sua iniciativa, mediante declaração de modelo oficial.
Como funciona o novo procedimento
O procedimento será exclusivamente eletrónico e pode ser realizado a partir do dia seguinte ao termo do prazo legal para que o senhorio tivesse feito a declaração (ou seja, até ao último dia do mês seguinte à assinatura do contrato).
Para o registo, o inquilino deverá autenticar-se no Portal das Finanças e apresentar:
- O contrato de arrendamento (mesmo que já tenha cessado);
- Documentos que comprovem os elementos comunicados (por exemplo, alterações de renda);
- A indicação do motivo da comunicação;
- O número de identificação do contrato, se já tiver sido previamente registado.
Cada comunicação deverá referir-se a um único contrato. Caso faltem documentos, a AT poderá posteriormente contactar o contribuinte para suprir omissões.
Acesso a apoios e benefícios fiscais
A comunicação voluntária por parte do inquilino permite-lhe, desde logo, aceder ao programa Porta 65 e ao Apoio Extraordinário à Renda, mecanismos que só funcionam se o contrato estiver devidamente registado nas Finanças.
Além disso, passa a ser possível deduzir no IRS as despesas com rendas, atualmente até 700 euros por ano — valor que subirá para 800 euros em 2026.
A Associação de Inquilinos Lisbonenses (AIL) vê com bons olhos esta nova ferramenta, considerando-a uma “antiga reivindicação” finalmente cumprida. No entanto, o presidente da associação, Pedro Ventura, levanta dúvidas quanto à aplicação prática da medida, especialmente nos casos em que não exista contrato escrito.
“Devia ser possível fazer a prova de outras formas, nomeadamente com a apresentação de contratos da luz, da água ou telecomunicações em nome do arrendatário”, defende o dirigente.
Mais preocupante ainda, segundo a AIL, é a ausência de mecanismos legais de proteção contra retaliações. Com o mercado habitacional extremamente pressionado, a entidade teme que alguns senhorios possam coagir os inquilinos a não procederem à comunicação, com receio de perderem os benefícios fiscais que resultariam do registo.
“Devia haver uma proteção ao inquilino para casos de pressão por parte do senhorio para que a declaração não aconteça”, alerta Pedro Ventura.














