Explicador: Como funcionam os concursos especiais de Medicina e porque estão a gerar polémica?

A polémica instalada na Universidade do Porto, depois de o reitor ter denunciado pressões para admitir candidatos sem nota mínima na prova do concurso especial de acesso a Medicina, trouxe para o debate público uma questão que até agora permanecia em grande parte desconhecida fora do meio académico.

Pedro Gonçalves
Setembro 5, 2025
15:59

A polémica instalada na Universidade do Porto, depois de o reitor ter denunciado pressões para admitir candidatos sem nota mínima na prova do concurso especial de acesso a Medicina, trouxe para o debate público uma questão que até agora permanecia em grande parte desconhecida fora do meio académico. O ministro Fernando Alexandre negou qualquer interferência, mas tanto ele como o reitor foram chamados ao Parlamento para prestar esclarecimentos. Afinal, o que são estes concursos especiais e como funcionam?

O que é o concurso especial para licenciados em Medicina?

Criado por decreto-lei em 2007, o concurso especial permite a entrada em Medicina a titulares de grau de licenciado em áreas previamente definidas. A ideia surgiu da crescente interligação da prática clínica e da investigação biomédica com disciplinas como Física, Biologia, Química ou Matemática. Assim, como acontece noutros países, abriu-se a porta a candidatos com perfis diversificados, desde que possuam conhecimentos adequados nas cadeiras nucleares exigidas para ingresso.

Ao contrário do concurso nacional, em que os alunos do secundário se candidatam através da Direção-Geral do Ensino Superior, aqui cada instituição de ensino superior organiza e gere o seu próprio processo, estabelecendo regulamentos próprios e critérios específicos de seleção.

Quem define as vagas?

A fixação das vagas é da responsabilidade de cada reitor. A lei determinou inicialmente que, entre 2007/2008 e 2010/2011, estas não podiam ser inferiores a 5% das vagas do concurso nacional em cada faculdade de Medicina. A partir de 2011, esse limite mínimo passou a ser de 15%.

Como são selecionados os candidatos?

O decreto de 2007 estipula que cada faculdade define os critérios de seriação, sujeitos à aprovação do órgão estatutariamente competente e à homologação do reitor. A avaliação deve incluir o percurso académico e profissional dos candidatos, mas as regras concretas variam de instituição para instituição.

No caso da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, o regulamento de 2019 estabelece quatro etapas:

  • avaliação curricular;
  • prova de conhecimentos em áreas como Biologia Celular e Molecular, Química e Matemática;
  • apreciação do percurso profissional;
  • carta de motivação redigida no dia da prova.

Só os candidatos com as melhores classificações na avaliação curricular podem realizar a prova escrita. Quem obtiver menos de 14 valores nessa prova é automaticamente excluído.

Quais as diferenças para o concurso nacional?

No concurso nacional, a nota de candidatura resulta da média do secundário, das classificações em exames nacionais escolhidos pelas universidades como provas de ingresso e, quando aplicável, dos pré-requisitos. Em Medicina, estas notas são tradicionalmente das mais elevadas. Este ano, por exemplo, a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto exigiu uma média mínima de 18,53 valores.

Nos concursos especiais, as universidades têm autonomia para estabelecer e publicar as regras de seleção. Os candidatos apresentam-se diretamente às instituições e não através da plataforma nacional.

O que acontece às vagas não preenchidas?

Até 2023, as vagas não ocupadas nos concursos especiais ficavam perdidas. Mas uma alteração legislativa determinou que revertessem para o concurso nacional de acesso.

Graças a essa medida, aumentou o número de vagas disponíveis para os alunos do secundário. Este ano, foram abertas inicialmente 1594 vagas em Medicina no concurso nacional. No entanto, acabaram por ser colocados 1647 estudantes, porque 53 vagas não preenchidas no concurso especial foram transferidas para a 1.ª fase. Em 2024, tinham revertido 65 vagas.

Quantas vagas foram abertas no Porto?

Em 2025, a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto abriu 245 vagas no concurso nacional. Para o concurso especial foram disponibilizadas 37 vagas, às quais concorreram 50 candidatos. Apenas sete obtiveram a classificação mínima de 14 valores na prova de conhecimentos.

Na prática, 30 vagas ficaram por preencher e foram transferidas para o concurso nacional, elevando o número final de colocados em Medicina no Porto para 275 estudantes. Situação semelhante ocorreu em Coimbra: das 268 vagas iniciais, somaram-se mais 19 libertadas pelo concurso especial, totalizando 287.

Só Medicina tem concursos especiais?

Não. Embora seja um dos cursos onde mais impacto têm, os concursos especiais existem noutras áreas do ensino superior. Entre eles, destacam-se o concurso para maiores de 23 anos, o concurso para titulares de diploma de técnico superior profissional e o concurso especial para estudantes internacionais. Todos têm regras e calendários próprios, complementando o concurso nacional, que continua a ser a principal via de acesso às universidades portuguesas.

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