Dos hospitais às pontes e aos ‘pipelines’: como aguentariam as infraestruturas críticas a um sismo?

Sismo de 5.3 na escala de Richter sentido em Portugal, esta segunda-feira, levantou a questão sobre a preparação do país para um abalo sísmico mais intenso, sobretudo no que diz respeito a infraestruturas essenciais para o funcionamento da sociedade, em particular hospitais e pontes

Executive Digest
Agosto 27, 2024
9:06

O sismo de 5.3 na escala de Richter sentido em Portugal, esta segunda-feira, levantou a questão sobre a preparação do país para um abalo sísmico mais intenso, sobretudo no que diz respeito a infraestruturas essenciais para o funcionamento da sociedade, em particular hospitais e pontes.

De acordo com especialistas ouvidos pelo ‘Observador’, a maior preocupação está nas infraestruturas de Lisboa – se a Ponte 25 de Abril é mais segura do que parece, o Hospital de Santa Maria, o maior do país, nem por isso. De acordo com Carlos Moedas, presidente da autarquia, garantiu que “só 10% dos edifícios municipais precisam de reforço” antissísmico: no entanto, em 2023, foi estimado que metade dos edifícios da cidade não resistiriam a um sismo.

“Um hospital é o que chamamos uma estrutura sensível. A função principal de um engenheiro num edifício de habitação típico é proteger a vida humana. Mas no hospital não é assim: tem de se manter funcional”, referiu Rodrigo Falcão Moreira, especialista em Estruturas e Segurança Sísmica de Edifícios. “A magnitude, por si só, não chega” para avaliar as consequências de um sismo num edifício porque “apenas mede a libertação de energia”, sendo essencial ter em conta o seu epicentro e a sua profundidade, assim como a data de construção dos edifícios, lembrou o professor do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP).

A construção do Hospital de Santa Maria terminou em 1953 – os edifícios da escola de enfermagem foram acrescentados entre 1968 e 1972. Quase uma década depois, em 1982, entrou em vigor o Regulamento de Segurança e Ações para Estruturas de Edifícios e Pontes, que obrigou à existência de proteções contra ações sísmicas. Se houvesse uma repetição do sismo de 1969, com uma magnitude de 7,8, os edifícios “construídos até à década de 80 sofreriam danos estruturais severos”, garantiu Rodrigo Falcão Moreira.

“A escala de magnitude, por si só, não é linear. Mas só comparando magnitudes, um 5 — em cidades com ação sísmica mais frequente — não é preocupante, mas um 7 já não é assim, há riscos sérios”, sustentou, lembrando que se se registasse uma “ação sísmica tipo 2, com epicentro na zona de Vale do Tejo, em terra, e com magnitude 7, e olhando para a época, é provável que o Hospital de Santa Maria sofresse danos”. Já se se repetisse o terramoto de 1755, “já haveria mais em jogo”, com uma libertação de energia significativamente grande, acrescentou o especialista.

“Em termos regulamentares, um sismo à volta de 6 na zona de Vale do Tejo provocaria vários danos. Lisboa tem edifícios muito antigos, as Torres das Amoreiras são da década de 70”, lembrou Rodrigo Falcão Moreira.

Já no Porto, a realidade é outra: “a perigosidade sísmica decresce à medida que avançamos para norte”, indicou o especialista. “A perigosidade não é uniforme. No Porto, a ação sísmica é cerca de 70% inferior” à da capital, garantiu. “No dia em que tivermos consequências sísmicas graves no Norte, Deus nos livre do que se irá estar a passar em Lisboa.”

A mesma opinião tem o engenheiro Armando Rito: sobre a emblemática Ponte D. Luís, o especialista lembrou que, além de um risco sísmico reduzido, a “estrutura é leve”. “Não acredito que, mesmo com um sismo intenso, possa haver problemas graves.”

Já a resistência da Ponte Vasco da Gama será apenas ligeiramente menor à da Ponte 25 de Abril, uma vez que não tem cabos curvos, mas sim uns tirantes, que partem dos pilares principais. O tabuleiro está semi-suspenso, explicou Armando Rito. “Não apoia na torre, tem uns dispositivos para amortecer. Se não existissem tínhamos movimentos do tabuleiro de até quatro metros. Agora, se abanar a torre principal, só será transmitido ao tabuleiro uma força baixinha.”

E se o abalo sísmico não tivesse sido no mar mas antes em Sines?

Rodrigo Falcão Moreira não escondeu a sua preocupação, uma vez que se trata de uma localidade com uma refinaria e um indústria. “Normalmente estas infraestruturas são previstas para resistir à intensidade sísmica acima da intensidade prevista para habitação, ou seja, o suficiente para garantir que a estrutura não colapsa e que as pessoas conseguem fugir”, disse o especialista em Estruturas e Segurança Sísmica de Edifícios do Porto.

“Podemos entrar numa catadupa de eventos. Se houver rotura de uma pipeline, há um derrame de fluído inflamável, que leva a um incêndio. Tudo se pode precipitar”, garantiu. Já em Lisboa, há que pensar “nas redes integradas de gás”. “Focamo-nos nos edifícios, mas também temos a questão das pontes e das estradas. Se tenho uma estrada intransitável, como é que chego ao hospital, que até está bem construído e planeado?”, garantiu Falcão Moreira. “O sismo desta segunda-feira foi relativamente superficial. Mas se tivesse sido localizado aos mesmos 10 quilómetros e diretamente por baixo de Sines estávamos a contar números de mortos”, concluiu.

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