Universidade Europeia: “Fundamentals de gestão” para além das modas e dos ciclos

Em Gestão e teorias organizacionais já assistimos a vários decretos, momentos e tomadas de decisões precipitadas. Por exemplo, a denominada M-Form; a empresa divisionalizada e organizada em matriz, foi enaltecida por Williamson e Chandler, como a maior, e derradeira, inovação organizacional do século XX. Parecia sero “fim da história” em termos de formas de estruturar uma empresa, em particular, se fosse uma multinacional. Sucedeu o entusiasmo com a “reengenharia de processos”, mãe já distante das formas agile e do entusiasmo com a gestão de projetos que atualmente provoca um interessante ímpeto de certificações, que aparentemente garantem uma quase imediata adaptação a qualquer contrariedade que apareça no meio envolvente do negócio. A flexibilidade total. Uma espécie de kung fu organizacional. Em contraponto com a conservadora visão da qualidade total, que se deduz de uma posição baseada em recursos e capacidades e nas virtudes do interior da organização, e de uma identidade e cultura à prova de fogo e de catástrofes no exterior.

Há anos testemunhei, em primeira mão, outra onda de entusiasmo, também final e definitiva. Fruto do contraciclo e do fiasco da teoria dos conglomerados, em que as empresas se diversificariam até ao infinito com um negócio em cada país e em cada sector, como se gerir um qualquer negócio de sapatos em Florença fosse igual a um negócio de hotelaria na Namíbia, em pleno ambiente de “small is beautiful” do Schumaker e do “stick to the knitting” do guru Tom Peters, veio o Outsourcing. Tudo o que não fosse “core”, era para ser corrido para fora das organizações e subcontratado. Apresentava-se um racional imbatível. Vinha da lógica financeira; transformar em custos variáveis os custos fixos.

Na Suécia, assisti ao desmembramento do departamento de manutenção de uma grande fábrica e às pessoas desse departamento a serem convidadas a criar o seu próprio negócio e passarem a prestadores de serviços. E assim foi. Anos depois, com surpresa, nessa fábrica vi que estavam lá de novo, mais o departamento de manutenção. Descobriram entrementes que, além de custos fixos que pareciam não fazer nada depois de excelentes planos de manutenção preventiva, que levavam mesmo a sério, durante o “resto” do tempo, afinal, os “desocupados” engenheiros de manutenção eram a fonte de incontáveis e muito valiosas inovações de processos industriais e mesmo de redesenho e adaptações em maquinaria que, aparentemente eram mesmo muito valiosas e não eram registadas na contabilidade. Nem geral, nem analítica, nem de atividade, nem de espécie alguma…

Não obstante a voracidade destas modas, de inúmeras outras que não podemos dar conta, e, nalguns casos a sua curta existência, permanecem lições úteis de todas elas. Quiçá, nenhuma foi o “fim da história”, mas todas deram contributos importantes para que a história das empresas fosse de maior sucesso.

Na atualidade vivemos, de novo, sob auspício de mais alguns e impressionantes chavões e buzzwords. E, de novo, políticos, académicos e alguns gestores parecem estar em clima de fim da história. “Transformação digital”, “marketing nas redes sociais”, “gestão baseada em ciência aplicada a lagos de dados”, “inovação em modelos de negócio”, “brands not products”, “criatividade 5.0”.

Todas estas prioridades parecem imperativas. De todas há aspectos interessantes, por certo mesmo essenciais. Mas de todas, para evitar mais um ciclo de mergulhos precipitados com a “reengenharia de processos” inventados para dinâmicas de front office – back office na atividade seguradora, em fábricas de mármores ou fábricas de conservas de atum, talvez convenha ter em atenção lições e princípios que já sobreviveram a tanto fim do mundo em negócios.

O entusiasmo, o sentido de urgência com a presença online, as vendas online, a otimização dos sites, a adaptabilidade e usabilidade dos procedimentos de encomenda, a facilidade de consulta de “catálogos” parece importante. É importante. Mas convêm não esquecer que quem compra são pessoas médias. Medianas. Modais. E não engenheiros informáticos que concebem algoritmos sofisticados. Aqui há já bastantes anos, a Inteligência Artificial provou ser muito útil. Na já famosa experiência do supermercado que associou fraldas para recém nascidos e cervejas. Uma associação totalmente idiota perante qualquer modelo conhecido e desconhecido de marketing ou de segmentação na altura. De facto, nunca ninguém se tinha apercebido da existência de miúdos, recentemente tornados pais, que eram “enviados” aos supermercados para comprar as necessidades básicas, entre as quais fraldas. Ainda semanas atrás ocupavam o seu tempo com a “crew”, os “homies”, jogando e bebendo e “hanging around da hood”. De repente transformados em “prisioneiros” ainda em adaptação. Bom, já que não podiam ir ter com os homies, podiam convidar os homies para casa e jogar e beber umas cervejas e ver a equipa da cidade a jogar, enquanto brincavam ou adormeciam o filho recém-nascido. Aparentemente um “segmento” em crescimento e valioso. Uma instrução misto de algoritmo genético, rede neuronal e inteligência de enxame detectou aquilo que muitos continuaram a rejeitar porque não parecia ser sequer lógico. À luz dos modelos dominantes.

Sem dúvida que as “redes sociais” são uma fonte de dano reputacional ou de escalada de vendas, a que se deve dar atenção e agir sem hesitação em qualquer dos casos. Sem dúvida que o digital é um domínio e uma fronteira incontornável. Sem dúvida que as formas e fontes de crowdfunding são, na atualidade, uma forma inteligente de evitar custos financeiros e de angariação de capital, inovadora e para grande irritação dos sistemas clássicos, por exemplo da banca e dos mercados de capitais. Sem dúvida que potencialmente as moedas digitais podem emergir como forma de pagamentos e transações.

Não obstante a necessária ponderação destas questões, e de alguma prudência na separação do trigo do joio, há questões que são Business Fundamentals. Tal como regras de ouro em finanças que ciclicamente parecem ser remetidas para o “caixote do lixo da história” e que regressam com grande estrondo e em geral com crises financeiras como o crash das Dot.Com, a crise do subprime e já para não falar no mecanismo de recuo das bazzoocas que muita gente assevera não existir…

Tal como o facto de a natureza humana ser essencialmente a mesma desde há milhares de anos.

Este artigo faz parte do Caderno Especial “MBA, Pós-Graduações & Formação de Executivos”, publicado na edição de Março (n.º 180) da Executive Digest.

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