Mind: Digitalização e IA estão a transformar a indústria têxtil e do calçado
Foram mais de 300 marcas e expositores que marcaram presença na 19ª Exposição Internacional de Máquinas, Tecnologia, Acessórios para a Indústria Têxtil, Confecção, Vestuário, Impressão e Bordados, espelhando a inovação tecnológica que tem contribuído para a evolução do sector.
No pavilhão 4 da Exponor – Feira Internacional do Porto, entre os dias 26 e 28 de Março, foram várias as empresas que mostraram as suas novidades, num encontro de expositores nacionais e internacionais, comprovando que a digitalização de processos e a inteligência artificial chegaram em força ao sector e estão a transformar a indústria.
Uma dessas empresas foi a Mind, que muito tem feito para introduzir novas tecnologias e ferramentas digitais, de forma a agilizar os processos no sector do calçado e do têxtil. Constituída 100% de capitais nacionais, esta empresa apresentou a nova versão do software MindCUT 6.1 que, nas palavras do director de Marketing, Fernando Vasconcelos, irá trazer «como principal novidade uma nova forma de assistente para pickup, um novo algoritmo para Feature Recognition e ainda uma forma diferente de abordar o print & cut quando aplicado à pele». Além disso, a Mind, que há 25 anos comercializa soluções integradas nas áreas das aplicações industriais (CAD/CAM) para as indústrias do Calçado, Malas e Marroquinaria, Transportes, Mobiliário e Vestuário, mostrou o novo sistema de CAD 3D, o MindSales, que permite a colocação de conteúdos 3D directamente em sites, com o controlo de versões e ligação à produção. Através do MindSales, é possível criar catálogos digitais em 3D, com grande realismo e desenhados para cativar a audiência. Mas as novidades não ficam por aqui.
MIND: APOSTA NA PRECISÃO E SUSTENTABILIDADE
A Mind é uma empresa portuguesa especializada no desenvolvimento de software CAD (Computer-Aided Design) para a indústria têxtil e de calçado. Durante a Maquitex/ Maquishoes, a empresa destacou as suas soluções tecnológicas para a digitalização e corte de materiais, com foco na eficiência e sustentabilidade.
No sector têxtil e do calçado, o software CAD/CAM permite acelerar diversas etapas dos processos de produção. Soluções como MindCad e MindCut permitem optimizar o corte de materiais, reduzindo desperdícios e melhorando a eficiência; garantindo que os elementos gráficos (como riscas ou xadrez) fiquem correctamente alinhados; e integração com máquinas de corte, tornando o processo de fabrico mais preciso e automatizado. Este software ajuda as empresas a melhorar a produtividade, reduzir custos e minimizar o impacto ambiental da produção.
Assim, entre as principais soluções apresentadas na Maquitex, a Mind deu especial destaque ao seu sistema de digitalização de peles, que identifica e classifica as zonas de qualidade. Esta acção permite optimizar a utilização do material, garantindo que as áreas de maior qualidade são utilizadas para as partes mais visíveis do calçado, enquanto as menos nobres podem ser usadas no interior.
A Mind desenvolveu, igualmente, um software de nesting, que maximiza o aproveitamento da pele ao organizar de forma eficiente as peças a cortar. Embora o processo possa ser automatizado, algumas marcas preferem ajustá-lo manualmente para garantir um alinhamento específico das peças. Nesse sentido, a empresa está também a investir em Realidade Aumentada, permitindo aos clientes visualizar melhor as peles e outros materiais que assumam muito brilho ou verniz e que tornem mais difícil a capacidade de ver o contorno do material, assim como alinhar correctamente as peças antes do corte, através de óculos de Realidade Aumentada. Esta é uma solução especialmente útil para marcas de luxo, que fazem já parte do portfólio de clientes da Mind. «Retirar projectores de vídeo e colocar óculos de Realidade Aumentada no operador permite que o operador esteja a olhar para a superfície do material e a ver virtualmente as peças que estão a ser cortadas, podendo fazer a sua recolha e todas as operações pós-corte necessárias», adianta João Bernardo, CEO da Mind.
Além disso, o mesmo responsável chama a atenção para outro aspecto inovador, relacionado com o casamento automático dos padrões dos tecidos antes do corte. «O processo tradicionalmente manual, feito em mesas de até 12 metros com operadoras especializadas a alinhar camada a camada, era moroso e sujeito a erros. Com esta nova tecnologia, não só fazemos a detecção dos padrões de forma automática, com câmaras digitais, como cortamos em monocamada. Cortamos uma camada de cada vez, o que garante um rigor extremo no corte de cada peça», destaca.
Outra inovação apresentada pela Mind durante a Maquitex/ Maquishoes foi a utilização da impressão 3D para a criação de protótipos de calçado. Esta possibilidade reduz a necessidade de produção de amostras físicas, tornando o processo mais rápido e sustentável.
O FUTURO É DEFINITIVAMENTE DIGITAL
Para o futuro, o CEO da Mind revela que a empresa já tem vários projectos em andamento com o centro tecnológico CITEVE, no âmbito da Agenda Texpact, financiada pelo Programa PRR. Uma das iniciativas e que estava em demonstração na feira, é a implementação de soluções robóticas para a recolha automática das peças após o corte. À medida que o ritmo de corte aumenta, a acumulação de peças na zona de recolha torna-se um desafio. Então, para optimizar o processo, um braço robótico irá recolher as peças e organizá-las automaticamente nos compartimentos correctos, encaminhando-as numa passadeira para a próxima fase da costura.
«Estas são as principais inovações que trazemos. Para 2025 é este o programa, uma vez que estamos envolvidos nestas duas grandes agendas – o Texpact, na área da confecção, e o FAIST, na área do calçado. São projectos que estão planeados terminar no fim de 2025, com uma eventual derrapagem para 2026», refere João Bernardo.
Por outro lado, a Mind mantém a parceria com a Zünd, uma empresa suíça cujo hardware é integrado com o software desenvolvido pela Mind em Portugal. Esta parceria permite que as máquinas suíças sejam vendidas internacionalmente com o software da Mind para os sectores têxtil e de calçado, consolidando a presença da empresa no mercado global.
Internacionalmente, João Bernardo sublinha a entrada da empresa num grande grupo brasileiro, o Grupo Soma, que detém várias marcas conhecidas, e que se tornou um dos clientes mais importantes da empresa. Além disso, a Mind procura entrar em marcas de luxo, como Gucci, Prada e Hermès, sabendo, no entanto, que conquistar esses clientes leva tempo, uma vez que são controlados por grandes players. «Ainda assim, os progressos são positivos, especialmente no sector da confecção. Em outras áreas, como calçado e malas, já estamos a trabalhar com marcas de prestígio», conclui. Nos Estados Unidos, a empresa tem como clientes a Nike, a Columbia Footwear. No sector automóvel, todos os carros da Bentley tem assentos cujo revestimento em pele é cortado utilzando MindCUT e máquinas Zund.
Com estes novos programas pretende-se que haja um impulso significativo na adopção de tecnologias e soluções digitais inovadoras, tornando o sector mais atractivo para os mercados globais e recursos humanos actuais e futuros, mais resiliente, mais sustentável e mais sofisticado.
SECTOR TÊXTIL E CALÇADO CONTEXTO NACIONAL
O sector têxtil em Portugal é vasto e complexo, abrangendo diversas actividades, desde a fiação, tecelagem e tricotagem até aos acabamentos, tinturarias e funcionalização. Além do vestuário, inclui têxteis-lar, reconhecidos internacionalmente, e têxteis técnicos para áreas como a saúde, automóvel, agricultura e pesca. «A indústria representa um pilar fundamental da economia nacional, especialmente na região Norte, gerando mais de 8 mil milhões de euros em volume de negócios e empregando mais de 125 mil trabalhadores. Na verdade, cerca de 8% das exportações nacionais provêm deste sector», afirma Ana Dinis, directora geral da ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal.
Actualmente, a indústria enfrenta um período de grande transformação, com a sustentabilidade e a digitalização a dominarem o debate. Predominantemente composto por micro, pequenas e médias empresas (PME), o sector reflecte a estrutura da economia portuguesa e, na opinião da mesma responsável, a falta de apoio das políticas públicas tem dificultado a competitividade.
A nível associativo, há um forte trabalho de lobby, tanto nacional como europeu, nomeadamente na Confederação Europeia dos Têxteis e do Vestuário. Segundo Ana Dinis, «a promoção da indústria portuguesa no mercado internacional é outra prioridade, procurando atrair mais marcas e clientes».
Nesse sentido, é importante que o país mostre competências que o torne mais competitivo internacionalmente e é nesse contexto que empresas como a Mind estão a fazer a diferença, mostrando avanços significativos em tecnologia, digitalização e sustentabilidade, com soluções inovadoras que melhoram a eficiência e reduzem o desperdício. «Durante muito tempo, tivemos uma lacuna no sector, pois havia pouca tecnologia portuguesa disponível para servir uma indústria nacional. Felizmente, isso está a mudar e vemos cada vez mais empresas como a Mind a surgirem. É este casamento entre a tecnologia, inovação, sustentabilidade, valor acrescentado e diferenciação que vai salvar, de uma maneira geral, todas as indústrias e em particular esta da indústria têxtil», sublinha a directora geral da ATP.
No entanto, ainda é necessário lidar com obstáculos estruturais que comprometem a competitividade. A energia é um factor crítico, pois Portugal tem custos elevados em comparação com outros mercados, tornando as empresas menos competitivas. Além disso, a carga fiscal, a burocracia e as diferenças regulatórias entre regiões dificultam a concorrência com países como a Turquia, o Norte de África e a Ásia. Outro desafio é a concorrência desleal de produtos importados sem controlo ambiental ou social, muitas vezes vendidos ao consumidor sem cumprir as regras da UE. «Isso compromete a qualidade dos produtos e impede a sua integração numa economia circular. Há, por isso, uma necessidade urgente de sensibilizar os consumidores para a valorização do que é produzido em Portugal e de reforçar o controlo sobre estas importações», conclui.
Este artigo faz parte da edição de Abril (n.º 229) da Executive Digest.