Ministra da Justiça admite aprofundar na lei mecanismos de direito premial
A ministra da Justiça admitiu aprofundar na lei os mecanismos de direito premial, que o procurador-geral da República, Amadeu Guerra, voltou hoje a apontar como um caminho para aumentar a eficácia do combate à corrupção.
À saída da sessão de abertura numa conferência na sede da Polícia Judiciária (PJ) dedicada ao combate à corrupção, Rita Alarcão Júdice disse que o mecanismo de direito premial é uma das matérias a trabalhar no âmbito da agenda anticorrupção do Governo e do grupo de trabalho dedicado ao direito penal a ser criado em janeiro.
“Não queremos preparar soluções que sejam feitas em cima do joelho, queremos soluções que sejam sólidas, que passem nos crivos judiciais e também constitucionais e por isso queremos dar a melhor solução possível e as melhores soluções possíveis precisam de tempo” para serem “à prova de bala”, disse.
“É um tema que vai ser analisado. Eu gostaria que fosse possível ir um pouco mais longe, é essa a nossa intenção. Há um equilíbrio que tem de ser encontrado e é esse equilíbrio que vai ser estudado e procurado. Não deitemos fora o bebé com a água do banho”, disse a ministra.
Na sessão de abertura, Amadeu Guerra repetiu grande parte das ideias e do discurso feito na segunda-feira nas comemorações do Dia Internacional contra a Corrupção, na Marinha Grande (Leiria), onde já tinha considerado que os mecanismos de deteção da corrupção estão mais eficazes, mas “ainda longe de ser perfeitos”, defendendo que a eficácia no combate pode aumentar com a colaboração dos denunciantes.
“Os mecanismos de exceção previstos na lei para estes casos devem constituir um estímulo efetivo à colaboração dos arguidos através de comportamentos reparadores ou através de uma colaboração probatória. Será ainda desejável que a aplicação das soluções legais existentes ao nível do direito premial fossem mais utilizadas com a finalidade de assegurar o efetivo incentivo à denúncia do crime, a colaboração para a descoberta da verdade, a reparação dos efeitos do crime”, disse hoje o procurador-geral da República.
Amadeu Guerra apelou a que este mecanismo legal seja mais publicitado, para que seja mais conhecido pela comunidade e com isso se possa retirar “vantagens no que diz respeito à investigação criminal”.
A ministra da Justiça anunciou ainda que o Governo vai na quinta-feira aprovar em Conselho de Ministros um diploma para regular o uso de embarcações de alta velocidade, as chamadas lanchas rápidas, frequentemente utilizadas no tráfico de droga internacional e detetadas pelas autoridades portuguesas junto à costa nacional.
“Há um diploma que vem regulamentar e criminalizar alguns comportamentos. O tráfico através de lanchas rápidas passa aqui à porta de Portugal. O que nós quisemos fazer foi criminalizar condutas e também aumentar coimas, aumentar a um maior rigor nos registos das lanchas para que possa haver maior controlo e apreensão das lanchas, se for caso disso”, disse a ministra aos jornalistas.
Questionada sobre o processo Operação Marquês, Rita Alarcão Júdice não quis fazer comentários concretos sobre o julgamento, ainda sem data marcada, mas não deixou de notar “por parte da magistratura um acordar e uma vontade de dar maior celeridade aos processos, também a este”, sublinhando que isso é algo que a “agrada como ministra da Justiça”.
Também em declarações aos jornalistas no final da sessão de abertura, o diretor nacional da PJ, Luís Neves, referiu-se à confirmação da condenação a uma pena de prisão efetiva do militante neonazi Mário Machado por incitamento ao ódio e à violência como “uma recompensa” ao trabalho de investigação daquela polícia.
“É uma decisão do ponto de vista jurídico, da investigação criminal e do ponto de vista humano que nos dá grande conforto”, disse, lembrando que a condenação vem na sequência de “um longo historial” de crimes cometidos pelo arguido.
E recordou tratar-se de “crimes de ódio, de incitamento à violência, designadamente perante mulheres que eram expostas, mulheres só porque pertencem a estruturas políticas de esquerda. Isso é absolutamente inadmissível”.
“Nós fizemos o nosso trabalho, conseguimos identificar os suspeitos que estavam por trás disto, ao fim ao cabo é para nós a única recompensa que estas vítimas que viveram aterrorizadas durante demasiado tempo têm, com base no nosso trabalho. Por isso, quero dizer em nome dos valores humanistas que subjazem à nossa atividade que esta é a maior recompensa para nós, é ter um resultado em que as vítimas ficam salvaguardadas”, concluiu.
O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a condenação do militante neonazi Mário Machado a uma pena de prisão efetiva de dois anos e 10 meses por um crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência.
Em causa está o processo em que Mário Machado e Ricardo Pais, o outro arguido no caso, foram condenados por crimes de discriminação e incitamento ao ódio e à violência por publicações em redes sociais, nas quais o tribunal de julgamento deu como provado terem apelado ao ódio e à violência contra mulheres de esquerda que visaram em particular a professora e então dirigente do Movimento Alternativa Socialista (MAS) Renata Cambra.
Em julgamento neste processo estiveram mensagens publicadas no antigo Twitter (atual X), atribuídas a Mário Machado e Ricardo Pais, em que estes apelavam à “prostituição forçada” das mulheres dos partidos de esquerda, e que visaram em particular Renata Cambra.