Tendências 2022: Análise de Jorge Rebelo de Almeida, Presidente do Grupo Vila Galé

Reunimos um conjunto de presidentes e CEO portugueses que nos ajudaram a traçar as perspectivas económicas para o país e empresas. E revelam também a medida que gostavam de ver debatida nos programas eleitorais do partidos


1. Quais as perspectivas para 2022 para o País, Economia e no seu sector de actividade?

No quadro de pandemia em que continuamos mergulhados, com avanços e recuos, entusiasmos fugazes seguidos de repetidas frustrações, fica difícil fazer prognósticos e previsões que entram já no domínio da adivinhação.

Em boa verdade podia-se ter feito melhor, sobretudo na comunicação, mas com justiça temos de reconhecer que o balanço é positivo.

Tomara que esta última variante de fácil e rápido contágio, mas de bem menos periculosidade seja o prenúncio de uma possível imunidade de grupo e do fim da pandemia.

No Turismo o balanço de 2021 traduziu uma melhoria em relação a 2020, mas ainda assim com uma quebra de facturação de perto de 50% relativamente a 2019. Mas com o melhor controlo de custos e com as ajudas estatais o resultado é já positivo em termos operacionais. Importante foi registar:

  1. A presença fortíssima do mercado interno que não tem possibilidade de ocupar toda a oferta disponível, mas ainda assim foi quem salvou o ano turístico;
  2. A demonstração de que os mercados internacionais, sobretudo no segmento de lazer estão ávidos de férias e viagens e que logo que a situação estabilize e se retome a confiança regressarão em força, mas só os nossos tradicionais, mas também novos segmentos de gente nova que vieram descobrir Portugal (veja-se por exemplo o caso da Madeira em que um turismo jovem veio complementar uma faixa etária mais elevada);
  3. Que a oferta turística nacional revelou uma consistência e uma resistência com as nossas equipas a alcançar o quase milagre de continuarem a prestar serviços de muita qualidade num cenário de extrema dificuldade, imprevisibilidade e até de mudança de regras constantes – podemos afirmar que foram verdadeiros heróis.

No entanto a previsão para os próximos meses é inexoravelmente desastrosa num período que turisticamente é de época baixa, mas a partir de Abril estou confiante de que regressaremos a uma quase normalidade, como aconteceu nos meses de Agosto, Setembro e Outubro último.

Mas atenção, novas dificuldades se apresentam no horizonte:

  • O regresso da inflação com aumentos já registados nestes últimos meses em inúmeros produtos;
  • A escassez de bens, real e também artificialmente criada pela especulação;
  • O previsível aumento das taxas de juro que virá agravar o serviço da dívida às empresas que a pandemia levou a aumentarem o seu endividamento;
  • A dificuldade acrescida na contratação de mão-de-obra.

E tudo isto num quadro de indefinição política e de governação.

São apenas alguns dos cenários que teremos de enfrentar a curto prazo, com coragem e determinação, mas também com a necessidade imperiosa de medidas e incentivos por parte do Estado.

Destes destacaria:

  • Apoios à formação de jovens à procura do primeiro emprego;
  • Formação “on job” para os trabalhadores em actividade;
  • Apoios à capitalização das empresas;
  • Incentivos ao reinvestimento;
  • Solução consistente para a TAP que pode, por exemplo, passar pela venda parcial à Lufthansa, bem negociada e que garanta o HUB de Lisboa;
  • Solução urgente para o novo aeroporto internacional de Lisboa, que representa um dos piores exemplos da nossa incapacidade de gestão.

Ainda que a TAP não tenha tido a relevância para o turismo, que muitas vezes se lhe pretende atribuir, designadamente nalguns destinos turísticos em Portugal – Algarve, Madeira, Porto, a verdade é que tem tido um papel importante na imagem de marca de um Portugal turístico (nalgumas ligações importantes – Brasil e EUA) e o impacto do seu desmoronamento pode ter efeitos previsivelmente negativos.

É nossa convicção que o futuro da TAP não deve passar apenas pela sua manutenção na tutela do Estado cujas qualidades de gestão não são certamente as melhores.

Ao contrário, deverá ser negociada a privatização da sua gestão não a qualquer preço, de forma segura e profissional, acautelando os interesses de Portugal e com boas perspectivas de recuperar a pesada ajuda que os contribuintes portugueses foram forçados a dar.

A Lufthansa beneficiou de ajudas públicas em elevado montante, mas em prazo curto tendo retomado o seu percurso e devolvido as ajudas públicas, torna-se um bom exemplo de gestão e um óptimo parceiro para a TAP.

Quanto ao Aeroporto de Lisboa – se houvesse um ranking dos casos de vergonha nacional, os sucessivos governos teriam conseguido ganhar o galardão máximo neste tema.

Portugal precisa de um novo aeroporto complementar ao da Portela para que este se possa manter enquanto for possível, pois trata-se de uma excelente mais valia para Portugal e até para o turismo, mas que possa ser uma alternativa real ao actual e que possa ser construído de uma forma faseada em função das necessidades efectivas e da disponibilidade financeira.

Bom será que os candidatos a assumir o governo de Portugal declarem de forma peremptória e com metas claras os seus compromissos nestas matérias.


2. Que medida gostava que constasse nos programas dos partidos para as eleições legislativas de Janeiro 2022?

A crise política que atravessamos corresponde a tudo aquilo que não nos fazia falta no meio da crise pandémica e do estrago que provocou nas contas e sobretudo no assustador aumento da dívida pública que conjugado com o previsível aumento das taxas de juro poderá ser devastador.

Uma vez mais os políticos vieram tomar posições que ajudam a explicar o crescente descredito na vida política dos eleitores e, também, o aumento da abstenção, pois revelam um flagrante desrespeito pelos interesses do país e pelos portugueses, privilegiando os interesses estritamente partidários.

  • Que o país quer ser governado em estabilidade e ao centro é uma evidência;
  • Que são indispensáveis reformas na organização administrativa do país que permitam uma melhor eficiência das autarquias e da qualidade de vida das pessoas; na Administração Pública com destaque para a Justiça, o Serviço Nacional de Saúde e Educação.

Ninguém tem dúvidas:

  • Que uma das principais carências da população portuguesa passa por conseguir resolver o problema de uma habitação condigna a preços condizentes com as remunerações praticadas no país é insofismável;
  • Que tem de haver uma estratégia nacional com ambição, força e consensos que possa implementar uma política de reequilíbrio entre o litoral e o interior, que retenha os talentos nas áreas em que hoje existe já uma carência flagrante e uma acentuada debandada para o exterior em busca e melhores salários e condições de vida.

Os dois principais partidos têm de ter uma posição clara sobre o nosso futuro colectivo, assim como consciência de que uma maioria absoluta não será suficiente para a dimensão das necessidades de Portugal e dos portugueses para ultrapassarem a estagnação em que se encontram.

Uma maioria absoluta pode até mesmo criar estabilidade, mas não reúne condições para dar o “salto” de que o país precisa.

É tempo de assumir como desígnio nacional a efectiva e melhoria da qualidade de vida dos portugueses.

Em vez de discussões mesquinhas sobre o salário mínimo nacional, temos de optar por condições para um crescimento sustentado que permita uma distribuição de riqueza.

É tempo de envolver e não hostilizar as empresas que são afinal quem cria riqueza tangível.

O PRR tem de ser gerido, com rigor, eficácia, ambição e com a consciência de que poderá ser irrepetível.

Neste quadro o Presidente da República tem uma oportunidade soberana de fazer a diferença, de conseguir conciliar interesses contraditórios em prol do interesse nacional.


Artigo publicado na revista Executive Digest n.º 190 de Janeiro de 2022

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